Trilheiros

Me mudei para Lindóia a um ano e 5 meses. Um lugar tranquilo, sossegado e muito bonito. Poucos habitantes e… sem muito o que fazer, a não ser trabalhos remotos.

Cidade pertencente ao Circuito das Águas de São Paulo (Águas de Lindóia, Lindóia, Serra Negra, Socorro etc.).

Tive o grande prazer de conhecer, através da minha senhora, um pessoal muito bacana, que faz parte de um time de trilheiros: Trilheiros das Serras.

E com eles, conheci os prazeres e as dores de se fazer trilhas….  Dores pra mim, é claro, que não sou mais Xóvem…. Estou na faixa Sexy……. Sexyssagenário!!!

Para eles, serão, sempre, aventuras deslumbrantes…. e são mesmo!

Pretendo, à medida que eu for participando das trilhas, escrever crônicas sobre as minhas aventuras… ou seriam desafios? Quem sabe peripécias ou passos desastrosos… bem, o futuro nos dirá!! De qualquer jeito, contarei sempre com a ajuda da minha senhora, e com o Toninho, um xóvem sensacional e nosso guia mor!!!!

Por hora, vou apresentar a minha primeira crônica, para apresentar, quiçá, o desastroso trilheiro… ou seja, eu!

O Épico Desastrado de um Trilheiro

Era um sábado de manhã ensolarado, e Carlos, um trilheiro entusiasmado por natureza — e desastrado por vocação —, decidiu que era o dia perfeito para conquistar aquela trilha famosa, conhecida tanto por suas vistas estonteantes quanto por sua capacidade de fazer qualquer GPS chorar de confusão.

Equipado com uma mochila que parecia mais um showroom ambulante de uma loja de artigos esportivos, Carlos iniciou sua jornada. A mochila estava recheada de todos os gadgets imagináveis: bússola, mapa, GPS (que ele suspeitava ser um modelo treinado exclusivamente em labirintos), barras de cereal que mais pareciam pedras nutritivas e, claro, uma câmera para registrar cada tropeço — digo, passo — da aventura.

Os primeiros metros foram gloriosos. O sol brilhava, os pássaros cantavam e Carlos se sentia o próprio Indiana Jones em busca do templo perdido. Mas como todo bom filme de aventura tem seus percalços, não demorou muito para as coisas começarem a desandar.

Ao tentar atravessar um riacho supostamente raso, Carlos descobriu que “raso” era um conceito muito relativo. Com uma elegância de um hipopótamo em patins, ele escorregou e realizou uma performance aquática digna de um espetáculo de nado sincronizado, só que completamente involuntário. A mochila à prova d’água, felizmente, fez jus ao nome, salvando seus snacks petrificados e eletrônicos.

Secando-se ao sol, e já um pouco menos digno, Carlos seguiu viagem. Ignorou o GPS que teimosamente insistia para que ele “fizesse um retorno legal” em plena mata fechada e decidiu confiar no velho e bom método de seguir o sol. Isso, claro, até se dar conta de que o sol estava quase a pino e, portanto, um guia tão útil quanto um semáforo no meio do deserto.

Depois de algumas horas, a trilha que deveria ser clara e bem marcada começou a se parecer mais com um teste de Rorschach. Aqui, um parêntese (Lito também é cultura):

O teste de Rorschach é uma técnica de avaliação psicológica conhecida como um teste projetivo. Ele foi desenvolvido pelo psiquiatra suíço Hermann Rorschach e é utilizado para analisar a personalidade e o funcionamento emocional dos indivíduos. No teste, os participantes são apresentados a uma série de manchas de tinta simétricas, geralmente em uma folha de papel, e são solicitados a descrever o que veem.

Em um momento de iluminação, Carlos decidiu seguir uma borboleta que, segundo ele, “parecia saber para onde estava indo”. Não sabia. Resultado: mais duas horas perdido, conversando com árvores e pedindo direções para um esquilo que claramente tinha mais compromissos do que ele.

Ao final, exausto, sujo e com metade das barras de cereal intactas — porque decididamente eram intragáveis —, Carlos encontrou o caminho de volta. Não havia conquistado o pico da montanha, mas certamente conquistou uma história épica de sobrevivência, ou pelo menos de persistência, para contar. E quem sabe, na próxima vez, ele poderia até levar um GPS que não fosse adepto do surrealismo.

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Alan Parsons

Se vocês tiverem curiosidade em ouvir a minha Webradio, irão perceber que sou um FÃ alucinado da banda The Alan Parsons Project!

Como é comum entre talentos da música, desde a mais tenra idade, o produtor e compositor inglês, Alan Parsons, começou sua carreira como técnico de gravação estagiário da gravadora EMI.

Em seguida, foi contratado pelo estúdio Abbey Road, onde participou de nada menos do que a gravação do álbum homônimo dos Beatles.

Antes de caminhar pelas estradas do sucesso como músico e com uma experiência considerável na bagagem, produziu o lendário álbum Dark Side of the Moon (1973) da banda de rock progressivo Pink Floyd, que lhe rendeu uma indicação ao Grammy de melhor mixagem no ano seguinte. Parsons ainda mixou trabalhos solo de artistas como Paul McCartney, George Harrison, The Hollies e Al Stewart, em seu álbum Year of the Cat (1976).

Em 1976, decidiu produzir seu próprio disco, agora atuando não só como técnico, mas também como músico. Uniu-se ao empresário e compositor Eric Woolfson e fundou o Alan Parsons Project, mantendo o estilo new age com pitadas de rock progressivo, que transformou em música e letras com temas peculiares. O primeiro álbum, de 1976 chamou-se Tales of Mistery and Imagination e foi inspirado na obra do escritor inglês Edgar Allan Poe.

Já no ano seguinte, I, Robot teve como musa inspiradora a ficção científica do livro de mesmo nome de Isaac Asimov. No final dos anos 80, porém, Woolfson seguiu outro caminho e Parsons decidiu continuar com o Project.

Em 1982, foi lançado seu maior hit. O incansável refrão ‘I can read your mind’ reverberava nas paradas, com o álbum Eye in the Sky, que ganhou inúmeros discos de ouro e platina no mundo inteiro.

Em seu último trabalho, A Valid Path lançado em 2004, Alan Parsons inova, mergulhando na música eletrônica presente em canções inéditas e em novas versões de algumas já bastante conhecidas. O álbum tem ainda a participação de David Gilmour, guitarrista do Pink Floyd.

The Alan Parsons Project

É um grupo de rock inglês formado nos fins dos anos 70 inícios dos anos 80 e foi fundado por Alan Parsons e Eric Woolfson.

Muitos dos seus títulos, especialmente os primeiros, partilham traços comuns com The Dark Side of the Moon do Pink Floyd, talvez influenciado pela sua participação como engenheiro de som na produção deste álbum em 1973. Eram álbuns conceituais que começavam com uma introdução instrumental esvanecendo-se na primeira canção, uma peça instrumental no meio do segundo lado do LP e terminavam com uma canção calma, triste e poderosa. (No entanto, a introdução instrumental só foi realizada até 1980 – a partir desse ano, nenhum álbum exceto “Eye In The Sky” possuiu uma.)

O grupo era bastante incomum na continuidade dos seus membros. Em particular, as vocalizações principais pareciam alternar entre Woolfson (principalmente nas músicas lentas e tristes) e uma grande variedade de vocalistas convidados escolhidos devido às suas características para interpretar determinado tema.

Mesmo assim, muitos sentem que o verdadeiro cerne do Projeto consistia exclusivamente de Alan Parsons e Eric Woolfson. Eric Woolfson era um advogado, por profissão, mas também um compositor clássico treinado e pianista. Alan Parsons era um produtor musical de grande sucesso. Ambos trabalharam juntos para conceber canções notáveis e com uma fidelidade impecável.

Andrew Powell (compositor e organizador de música de orquestra durante a vida do projeto), Ian Bairnson (guitarrista) e Richard Cottle (sintetizador e saxofonista) também se tornaram partes integrais do som do Projeto. Powell é também acreditado por ter composto uma banda sonora ao estilo do Projeto para o filme Feitiço de Áquila (Ladyhawke em inglês) de Richard Donner.

Discografia

1975 Tales of Mystery and Imagination, Edgar Allan Poe – Baseado em histórias do escritor Edgar Allan Poe. A posterior reedição em CD (1987) tinha uma introdução falada por Orson Welles.

1977 I Robot – É o título da obra de Isaac Asimov. Muitas das canções deste álbum são baseadas em novelas deste escritor. O álbum é chamado de “uma visão do amanhã através dos olhos de hoje”.

1978 Pyramid – O Antigo Egipto emerge repetidamente, o álbum é chamado de “uma visão do ontem através dos olhos de hoje”.

1979 Eve – Acerca das mulheres.

1980 The Turn of a Friendly Card – Acerca do jogo.

1982 Eye in the Sky – Acerca da Vida e do Universo, contém o seu single mais famoso, “Eye in the Sky.” “Sirius,” uma faixa instrumental que imediatamente precede “Eye in the Sky” no álbum, é frequentemente utilizada como música de entrada por equipes desportivas americanas; é provavelmente mais conhecida pelo seu uso pelos Chicago Bulls durante a era Michael Jordan.

1983 Ammonia Avenue, este é o seu álbum melhor sucedido comercialmente.

1984 Vulture Culture, uma crítica ao consumismo e, em particular, à cultura popular americana.

1985 Stereotomy – Os pontos de vista de personagens com diferentes doenças mentais.

1987 Gaudi – Acerca do arquiteto Antoni Gaudí e o seu trabalho mais famoso, La Sagrada Família.

Após estes álbuns, Parsons lançou outros títulos sob o seu nome, enquanto que Woolfson fez um último álbum conceitual chamado Freudiana (acerca do trabalho de Sigmund Freud na Psicologia).

Embora a versão de estúdio de Freudiana tenha sido produzida por Alan Parsons, foi principalmente de Eric Woolfson a ideia de convertê-lo num musical. Isto eventualmente levou a uma separação entre os dois artistas.

Enquanto que Alan Parsons seguiu uma carreira solo (levando muitos membros do Projeto para a estrada, pela primeira vez numa tournée mundial de sucesso), Eric Woolfson foi produzir musicais influenciados pela música do Projeto. Freudiana e Gambler foram dois musicais que continham êxitos da banda como “Eye in the Sky”, “Time”, “Inside Looking Out” e “Limelight”.

Membros

Alan Parsons, tecladista, produtor, engenheiro;
Eric Woolfson, tecladista, produtor executivo;
Andrew Powell, tecladista, arranjo para orquestra;
Ian Bairnson, guitarrista
Baixo: David Paton (1975-1985); Laurie Cottle (1985-1987)
Bateria, Percussão: Stuart Tosh (1975-1977); Stuart Elliott (1977-1987)
Saxofone, Teclado: Mel Collins (1980-1984); Richard Cottle (1984-1987)
Vocais: Eric Woolfson, Lenny Zakatek, John Miles, Chris Rainbow, Colin Blunstone, David Paton, e muitos outros.

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Kremlin

O Kremlin visto a partir da Casa no Cais

O Kremlin é um complexo fortificado localizado no centro de Moscou, na Rússia, constituído de torres, muralhas, palácios e catedrais. A construção do Kremlin começou no século 12. Como um dos marcos históricos mais famosos da Rússia, tem desempenhado um papel crucial na história russa como a principal sede da realeza e do governo russos.

O Kremlin foi construído sobre a Colina Borovitsky e cercado pela Praça Vermelha, pelo Rio Moskva (Rio Moscou ou Rio Moscovo, em português do Brasil e em português de Portugal, respectivamente) e pelos Jardins de Alexandre. Ele está escondido atrás de altas muralhas e ocupa 28 hectares (70 acres). É uma lembrança do esplendor russo com seus ricos mármores, paredes vermelhas, pedras brancas e azulejos coloridos. Ele permanece um símbolo perene da longa história russa, com suas muralhas testemunhando coroações, funerais, execuções e intrigas políticas. Ele foi queimado em um incêndio, destruído e reconstruído muitas vezes através da história. A história do Kremlin pode ser dividida em três períodos principais: o Kremlin original de madeira, o Kremlin renascentista e o Kremlin moderno.

Fundação

O KREMLIN FUNCIONAVA COMO UMA PEQUENA CIDADE E SE TORNOU O CENTRO POLÍTICO E ECONÔMICO DE MOSCOU.

O primeiro Kremlin foi construído em 1156 durante o reinado do príncipe Yuri Dolgoruky (1099-1157) (no português europeu, também conhecido como Jorge I, Jorge ou Iuri Longímano). A estrutura de madeira foi construída em uma localização estratégica no topo da Colina Borovitsky, 145 metros acima do nível do mar e com vista para o Rio Moscou e para o Rio Neglinnaya (este último atualmente subterrâneo). As águas do Rio Moscou fluem em direção a um dos maiores cursos d’água da Rússia – o Rio Volga, que, por sua vez, deságua no Mar Cáspio – fazendo daquele um cruzamento entre o norte e o sul da Rússia.

O primeiro Kremlin era cercado por um fosso de cinco metros de profundidade e uma muralha feita de carvalho. Protegidas pelas muralhas estavam as casas dos sacerdotes, dos comerciantes e a propriedade da realeza.

Ivan I de Moscou

O príncipe Ivan Danilovich Kalita (Ivan I de Moscou, 1325-1340) foi o primeiro governante importante de Moscou a fazer grandes mudanças no Kremlin. Ivan I era um aliado da Horda Dourada mongol, o que lhe dava poder e proteção. Ele usou sua riqueza para transformar Moscou em uma cidade grandiosa. Ele construiu a Catedral da Assunção (1326-1327), a Igreja de São João da Escada (também conhecido como São João Clímaco, João Escolástico ou João Sinaíta), a Torre do Sino (1329), a Catedral do Salvador na Floresta (1330) e a Catedral de São Miguel Arcanjo (1333). Ele também substituiu as muralhas do Kremlin por carvalho maciço. Torres de até 13 metros de altura foram levantadas e portões foram criados.

O Kremlin funcionava como uma pequena cidade e se tornou o centro político e econômico de Moscou. Durante o reinado de Ivan I, o Kremlin era conhecido como a grad (a cidade). Os ricos eram capazes de construir casas grandiosas dentro das muralhas, ao longo do palácio e das catedrais. Embora o Kremlin crescesse em tamanho e esplendor, ele era uma fortaleza construída essencialmente de madeira, o que representava uma ameaça significativa, não demorando muito para que as muralhas se deteriorassem.

Vista aérea do Kremlin

Príncipe Dmitry Donskoi

O príncipe Dmitry Donskoi (1359-1389) era neto de Ivan I de Moscou. Durante o seu reinado, o Kremlin foi destruído e reconstruído, o que encorajou Dmitry a substituir as muralhas e torres de madeira por pedra calcária branca em 1367. As novas muralhas foram construídas além do lugar das antigas, aumentando o tamanho da fortaleza. Um novo fosso foi cavado, as muralhas foram aumentadas para 7 metros de altura, ameias (parapeitos localizados na parte superior das muralhas) foram instaladas e a artilharia foi colocada nas passarelas no alto das muralhas.

O novo Kremlin estava completo em 1368 e rapidamente enfrentou uma invasão do exército lituano sob liderança do príncipe Algirdas (r. 1345-1377). O primeiro cerco ao Kremlin durou apenas três dias. O exército lituano acabou sendo derrotado pela imponente estrutura do Kremlin. Os lituanos retornaram em 1370, mas não conseguiram romper as muralhas. Contudo, eles conseguiram queimar parte da cidade fora do Kremlin. Esse segundo ataque rapidamente terminou em uma trégua, e o Kremlin mais uma vez foi poupado de qualquer dano significativo.

A queda do Kremlin em 1382

Em 1382, o Kremlin enfrentou a primeira ameaça real da Horda Dourada mongol e do Khan Toketamis (c.1342-1406). O príncipe Dmitry fugiu de Moscou à medida que a Horda Dourada se aproximava. O Kremlin resistiu a três dias de cerco – uma impressionante demonstração de resistência contra 30 mil homens treinados.

Ao final, a queda do Kremlin foi resultado de um embuste. O príncipe de Suzdal (ou Susdália), do Principado de Vladimir-Suzdal havia se alinhado com o Khan Toketamis e a Horda Dourada. Eles persuadiram as pessoas de que a desavença deles era apenas com Dmitry, e não com o povo de Moscou. Acreditando nessa mentira, os portões do Kremlin foram abertos e a Horda Dourada atacou. Eles saquearam e queimaram o Kremlin e mataram ou escravizaram milhares. Dmitry retornou ao Kremlin, ampliou as muralhas e defesas e reconstruiu seus edifícios em pedra.

Catedral de São Miguel Arcanjo, Moscou

O Kremlin italiano

No século 15, muitos edifícios do Kremlin estavam deteriorados e em mau estado. Incêndios, um terremoto e as intempéries da natureza haviam cobrado seu preço das estruturas que não haviam sido construídas para durar. Durante seu reinado, Ivan III (Ivan, o Grande, r. 1462-1505) assumiu o grande projeto de reconstruir o Kremlin. Ele queria que Moscou representasse o poder da Rússia, uma cidade que estava sendo referida como a “Terceira Roma”. Durante o Renascimento, o talento dos arquitetos italianos era amplamente admirado por toda a Europa. Em 1474, Ivan III enviou um grupo de representantes à Itália para contratar um arquiteto italiano.

EM 1538, AS MURALHAS DE MADEIRA HAVIAM SIDO SUBSTITUÍDAS POR MURALHAS DE TIJOLOS, SETE PORTÕES E 13 TORRES.

Ridolfo Fioravanti (também conhecido como “Aristotele” Fioravanti, c.1415/1420 to c.1486), um arquiteto de Bolonha, engenheiro e expert em fortificações, foi trazido a Moscou. Seus talentos eram muito demandados, mas Ridolfo decidiu que Moscou seria o melhor lugar para exibir seu trabalho plenamente.

Fioravanti determinou que tijolos fossem usados no Kremlin para fortalecer as estruturas de calcário já existentes e introduziu o uso de pás de metal e um sistema de polia para os construtores. Seus edifícios tinham uma pálida cor creme, dando-lhes um visual elegante. O trabalho mais famoso de Fioravanti foi a Catedral da Dormição (também conhecida como a nova Catedral da Assunção), que foi consagrada em 1479 e é considerada uma das mais sagradas catedrais de Moscou. Depois da morte de Fioravanti, mais arquitetos e engenheiros foram trazidos da Itália.

Em 1480, o arquiteto Marco Ruffo (também conhecido como Marco Fryazin) chegou em Moscou e trabalhou no Palácio Grão-Ducal (1514) e na espetacular Câmara das Facetas (que posteriormente se tornou o Palácio das Facetas), o refeitório da realeza. A pedido de Ivan III, Aloísio, o Novo (comumente identificado como Aloísio Lamberti de Montagnana), começou a construção da nova Catedral de São Miguel Arcanjo (1508), o futuro local de enterro de muitos membros da realeza. Contudo, Ivan III morreu três anos antes do término de sua construção e nunca chegou a ver o resultado final, um bonito edifício de tijolos vermelhos e pedras brancas. O Campanário de Ivan, o Grande, foi concluído em 1508 pelo arquiteto Bon Fryazin e é a mais alta estrutura no Kremlin, desempenhando um papel crucial na defesa do Kremlin como torre de vigilância central.

Campanário de Ivan, o Grande

O arquiteto italiano mais famoso a trabalhar no Kremlin foi Pietro Antonio Solari (c.1445-1493), que chegou em Moscou em 1490 para continuar o trabalho de Fioravanti. Solari construiu a Torre Konstantino-Eleninskaya (Torre de Constantino e Helena) e a Torre Borovitskaya em 1490. Em 1491, Solari completou as mais importantes torres e portões de entrada do Kremlin (a Frolov e a Nikolsky). Solari também completou a principal linha de muralhas e o Palácio das Facetas (1492). Seu último projeto foi a Torre do Arsenal (anteriormente conhecida como Torre Sobakina), na qual ele incluiu um reservatório de água que está em funcionamento até os dias de hoje. Antes de sua morte, Solari recomendou que seu substituto fosse Aloísio de Carcano (também conhecido como Aloísio da Caresana, Aloisio da Milano, Aleviz Milanets e Aleviz Fryazin), que criou um fosso ligando os Rios Moscou e Neglinnaya em 1508.

O sucessor de Ivan III, Basílio III da Rússia (r. 1505-1533), continuou utilizando arquitetos italianos para construir uma segunda linha de muralhas e torres. Em 1538, as muralhas de madeira haviam sido substituídas por muralhas de tijolo, sete portões e 13 torres. O Kremlin havia se tornado um inacessível labirinto de muralhas e torres, cujas defesas e traçados foram mantidos em segredo dos estrangeiros, embora a maior parte tenha sido construída pelos arquitetos e engenheiros italianos.

O Kremlin sob o governo de Ivan, o Terrível

Ivan IV da Rússia (Ivan, o Terrível; r. 1533-1547 como Príncipe de Moscou; r. 1547-1584 como Tsar da Rússia) foi o primeiro governante russo a ser formalmente coroado como Tsar. Durante seu reinado, o Kremlin começou a ganhar sua forma moderna. As ruas receberam paralelepípedos, o Palácio do Tsar foi renovado e ampliado, a Catedral da Anunciação (1489) passou a ter nove domos em seu telhado. O Kremlin estava rapidamente se tornando uma fortaleza para os Tsares e seus amigos mais próximos. Ivan IV tomou as propriedades de comerciantes e nobres e as deu a seus leais apoiadores.

O Kremlin durante o Tempo de Dificuldades

O Tempo de Dificuldades (1598-1612) começou com a morte do Tsar Teodoro I da Rússia (r. 1584-1598), o qual não deixou herdeiros. O que se seguiu foi uma década de morte e destruição enquanto o trono era disputado. Os boiardos (integrantes da nobreza russa) ficaram confinados atrás das altas muralhas do Kremlin. Forças estrangeiras promoveram cercos ao Kremlin, enquanto os edifícios em Moscou, fora de suas muralhas, eram reduzidos a cinzas.

A seu tempo, fome e doenças caíram sobre toda a cidade de Moscou, incluindo sobre aqueles que estavam confinados no Kremlin que, em pouco tempo, se transformou em um símbolo de destruição e morte.

Os Romanovs e o Kremlin

Miguel I da Rússia (Mikhail Fyodorovich Romanov, r. 1613-1645) foi o primeiro Tsar da dinastia Romanov. Seu reino começou logo após o término do chamado Tempo de Dificuldades. As muralhas do Kremlin ainda estavam cobertas de fuligem e escombros bloqueavam suas ruas. Portões foram quebrados e o fosso estava cheio de destroços. Miguel I aumentou os impostos de modo que reparos urgentes pudessem ser feitos. O Palácio das Facetas foi rapidamente reparado de modo que Miguel I pudesse ser coroado lá. Mais uma vez, trabalhadores foram trazidos do exterior para trabalhar no Kremlin, uma vez que materiais e trabalhadores locais eram escassos.

O mais notável projeto de edificação durante o reinado de Miguel I foi o do Palácio dos Terems (anos 1630), construído com tijolos por um time de construtores russos. Era um edifício grandioso com esculturas intrincadas, cores brilhantes, janelas envidraçadas e telhado dourado. O Palácio dos Terems tornou-se a residência principal dos Tsares durante o século 17.

Pilar no Palácio das Facetas

Pedro I da Rússia (Pedro, o Grande), foi o Tsar da Rússia de 1682 a 1721 e imperador da Rússia de 1721 a 1725. Durante seu reinado, o Kremlin era visto como uma fortaleza antiquada com múltiplos problemas. Ele havia sido caiado para invocar seu aspecto original e não era mais tão impressionante ou distinto. Pedro I era inquieto e frequentemente viajava para caçar em sua propriedade em Preobrazhenskoye. Contudo, ele regularmente retornava ao Kremlin para cuidar de questões de estado. Pedro I construiu uma nova cidade chamada São Petersburgo, a qual se tornou a nova capital russa em 1713. O Kremlin permaneceu a residência real, mas rapidamente passou a ser vista como uma velha relíquia.

A imperatriz Isabel da Rússia (r. 1741-1762) empregou seu arquiteto favorito, Francesco Bartolomeo Rastrelli (1700-1771), para construir um Palácio de Inverno (1749) no Kremlin. Esse Palácio de Inverno era de madeira e menos opulento que a versão de São Petersburgo (1754), o qual também foi construído por Rastrelli.

Catarina II da Rússia (Catarina, a Grande, r. 1762-1796) não gostava de Moscou nem do Kremlin; contudo, ela sabia de sua importância para o povo russo e escolheu ser coroada lá. Em 1770, Catarina criou um plano para restaurar as principais catedrais do Kremlin. Catarina II escolheu o arquiteto russo Vasily Bazhenov (1737-1799) para transformar o Kremlin em um lugar à altura do Império Russo. Sendo inspirado pela Basílica de São Pedro, em Roma, e tendo crescido ao redor do Kremlin, ele foi inspirado a fazer grandes mudanças.

NO SÉCULO 19, O KREMLIN SE TORNOU UM SÍMBOLO DO ESPLENDOR E DA GLÓRIA RUSSA.

A visão de Bazhenov incluía um novo palácio grandioso, uma área para realização de paradas militares e azulejos de mármore. Para abrir caminho para esse empreendimento, prédios antigos do Kremlin tiveram de vir abaixo, incluindo a original Primeira Torre Inominada, a Torre Taynitskaya, o Arsenal e a catedral dedicada aos mártires. Bazhenov testou seu trabalho em modelos em miniatura, o que atraiu uma multidão de admiradores. Todas as obras foram suspensas quando uma praga atingiu Moscou em 1771 e somente foram reiniciadas em 1772. Bazhenov fortaleceu e consertou as três principais catedrais e o Campanário de Ivan, o Grande. A pedra fundamental para seu grandioso palácio foi lançada. Colunas dóricas representando a Ásia, a Europa, a África e a América foram colocadas em cada canto do palácio.

Contudo, a construção do palácio rapidamente teve problemas. Catarina estava perdendo interesse no empreendimento. Ela já não possuía mais a mesma dedicação e chegou a faltar na cerimônia da pedra fundamental. O financiamento das obras estava em nível perigosamente baixo. No fim das contas, o legado mais duradouro de Bazhenov no Kremlin foram seus modelos em miniatura. Ele nunca conseguiu construir seu grandioso palácio no Kremlin.

Ao final do século 18, a construção do Kremlin foi transferida para o arquiteto Matvey Fyodorovich Kazakov (1738-1812), que colocou traços góticos no prédio do Senado e em outras estruturas governamentais. Outro arquiteto, Ivan Vasilyevich Egotov (1756-1815), construiu o último Arsenal, o qual posteriormente foi transformado no primeiro museu de história russa.

Catedral da Dormição, Moscou

O ataque de Napoleão ao Kremlin

No século 19, o Kremlin era um símbolo do esplendor e da glória russa. Em 1912, o exército de Napoleão Bonaparte (r. 1804-1815) invadiu a Rússia, derrotou o exército comandado pelo marechal de campo Mikhail Kutuzov (1745-1813) e conquistou o Kremlin. Napoleão ficou no Kremlin por um dia até que incêndios se espalharam novamente por Moscou. O fogo cercou o Kremlin e Napoleão se retirou através de um túnel que terminava às margens do Rio Moscou.

Napoleão ficou no Palácio Petrovsky até que os incêndios fossem extintos. Ele então retornou ao Kremlin e decidiu estabelecer sua residência e corte ali. À medida que o inverno se aproximava, a comida ficava cada vez mais difícil de ser encontrada. Napoleão e seus homens retiraram-se de novo, mas desta vez Napoleão ordenou que o Kremlin fosse destruído. O Palácio das Facetas foi incendiado e barris de pólvora foram colocados ao redor das torres e muralhas. A pólvora, entretanto, umedeceu, e a tentativa de destruir o Kremlin, assim como a invasão da Rússia por Napoleão, foi, sobretudo, um fracasso. Algumas muralhas e torres foram danificadas, mas a Torre Vodovzvodnaya veio abaixo. Um soldado russo afirmou: “enquanto os sinos tocarem, o Kremlin resistirá”.

O arquiteto Fyodor Sokolov (1752-1824) foi contratado para reconstruir o Kremlin. Levou 20 anos até que o Kremlin fosse restaurado ao seu antigo esplendor.

As impressionantes construções no Kremlin

Ao longo dos anos, várias torres, catedrais, igrejas e palácios foram construídos no Kremlin. Dentre eles, incluem-se:

Torres

  • a Torre Taynitskaya (a Torre Secreta), completada em 1485;
  • a Torre Beklemishevskaya (Torre de Beklemishev), completada em 1488;
  • a Torre Vodovzvodnaya (a Torre de Abastecimento de Água), completada em 1488;
  • a Torre Konstantino-Eleninskaya (Torre de São Constantino e Helena), completada em 1490;
  • a Torre Borovitskaya (a Torre da Floresta ou Torre da Colina), completada em 1490;
  • a Torre Spasskaya (a Torre do Salvador), completada em 1491;
  • a Torre Komendantskaya (a Torre do Mandamento), completada em 1495;
  • a Torre Nabatnaya (a Torre de Alarme), completada em 1495;
  • a Torre Oruzheynaya (a Torre do Arsenal), completada em 1495;
  • a Torre Troitskaya (a Torre da Trindade), completada em 1499;
  • o Campanário de Ivan, o Grande, completado em 1508.

Catedrais e Igrejas

  • a Igreja da Natividade da Mãe de Deus, consagrada em 1394;
  • a Catedral da Dormição (Catedral da Assunção), consagrada em 1479;
  • a Igreja da Deposição das Vestes, consagrada em 1485;
  • a Catedral da Anunciação, consagrada em 1489;
  • a Catedral de São Miguel Arcanjo, consagrada em 1489;
  • a Catedral de São Basílio, consagrada em 1561;
  • a Igreja dos Doze Apóstolos, consagrada em 1656.

Palácios

  • o Palácio das Facetas, completado em 1492;
  • o Palácio dos Terems, completado em 1636;
  • o Grande Palácio do Kremlin, completado em 1849;
  • o Palácio Estatal do Kremlin, completado em 1961.

Grande Palácio do Kremlin, Moscou

O Kremlin hoje

O Kremlin é um dos marcos históricos mais famosos e visitados da Rússia. Ele tem tido um papel fundamental na história da realeza, da política, da religião e da defesa da Rússia. Atualmente, ele permanece como centro do governo russo. O Grande Palácio do Kremlin tornou-se a residência oficial do presidente russo em 2023.

O Kremlin ainda permanece uma fortaleza em todos os sentidos da palavra. Sua forte segurança é supervisionada pelo Gabinete do Comissário do Kremlin de Moscou e pelo Regimento do Kremlin (Regimento Presidencial). Há estritos protocolos de segurança estabelecidos para proteger seu patrimônio histórico, tais como sistemas de bloqueio de GPS e proteção pela Defesa Aérea da Região de Moscou. Apesar de toda a segurança, turistas são permitidos a visitar o Kremlin, com milhares de visitantes atraídos todos os anos por suas imponentes catedrais com domos dourados, muralhas vermelhas, torres e telhados multicoloridos. O Kremlin tem visto o melhor e o pior da história russa e continuará a desempenhar um papel essencial no futuro da Rússia.

Perguntas e respostas

Por que o Kremlin é tão famoso?

O Kremlin tem sido o centro da política e da realeza russa por centenas de anos. É um dos marcos históricos mais famosos da Rússia.

Qual a idade do Kremlin?

O Kremlin original foi construído no século 12. Desde então, construções, muralhas e torres têm sido destruídas e reconstruídas muitas vezes.

É possível visitar o Kremlin?

Sim, o Kremlin é uma das atrações turísticas mais populares da Rússia. Há empresas que ajudam a organizar uma visita ao Kremlin.

O presidente russo mora no Kremlin?

Sim, o Grande Palácio do Kremlin tornou-se a residência oficial do presidente russo em 2023.

Miate, Liana. “Kremlin.” Traduzido por Elmer Marques. World History Encyclopedia. Última modificação Janeiro 25, 2024. https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-22579/kremlin/.

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Uma visão Básica da História da Música

A História da música é muito antiga, visto que desde os primórdios os homens produziam diversas formas de sonoridade.

Esse é um tipo de arte que trabalha com a harmonia entre os sons, o ritmo, a melodia, a voz.
Todos esses elementos são importantes e podem nos transportar para outro tempo e espaço, resgatar memórias e reacender emoções.

Veremos como essa linguagem artística caminhou durante os séculos até os nossos dias para adquirir as características que possui hoje no Ocidente.

Música na Pré-História

Pintura rupestre encontrada na Espanha exibe várias pessoas dançando, o que sugere a presença de música também

A humanidade possui uma relação longa com a música, sendo essa umas das formas de manifestação cultural mais antigas.

Ainda na pré-história, há mais de 50 mil anos, os seres humanos começaram a desenvolver ações sonoras baseadas na observação dos fenômenos da natureza.

Os ruídos das ondas quebrando na praia, os trovões, a comunicação entre os animais, o barulho do vento balançando as árvores, as batidas do coração; tudo isso influenciou as pessoas a também explorarem os sons que seus próprios corpos produziam. Como, por exemplo, os sons das palmas, dos pés batendo no chão, da própria voz, entre outros.

Nessa época, tais experimentações não eram consideradas arte propriamente e estavam relacionadas à comunicação, aos ritos sagrados e à dança.

A Evolução da Música

Música no Egito

Representação de músicos no Antigo Egito

No Egito Antigo, ainda em 4.000 a.C., a música era muito presente, configurando um importante elemento religioso. Os egípcios consideravam que essa forma de arte era uma invenção do deus Thoth e que outro deus, Osíris, a utilizou como uma maneira para civilizar o mundo.

A música era empregada para complementar os rituais sagrados em torno da agricultura, que era farta na região. Os instrumentos utilizados eram harpas, flautas, instrumentos de percussão e cítara – que é um instrumento de cordas derivado da lira.

Música na Mesopotâmia

Músicos assírios tocando instrumentos

Na região da Mesopotâmia, localizada entre os rios Tigre e Eufrates, habitavam os povos sumérios, assírios e babilônios. Foram encontradas harpas de 3 a 20 cordas na região onde os sumérios viviam e estima-se que sejam objetos com mais de 5 mil anos. Também foram descobertas cítaras que pertenceram ao povo assírio.

Música na China e na Índia

À esquerda, representação de pessoa tocando instrumento na Índia; à direita, flautas chinesas encontradas por arqueólogos

Na Ásia – em torno de 3.000 a.C. – a atividade musical prosperou na Índia e China. Nessas regiões, ela também estava fortemente relacionada à espiritualidade.

O instrumento mais popular entre os chineses era a cítara e o sistema musical utilizado era a escala de cinco tons – pentatônica.

Já na Índia, em 800 a.C., o método musical era o de “ragas”, que não utilizava notas musicais e era composto de tons e semitons.

Música na Grécia e em Roma

Representação de pessoa tocando instrumento na Grécia Antiga

Podemos observar que a cultura musical na Grécia Antiga funcionava como uma espécie de elo entre os homens e as divindades. Tanto que a palavra “música” provém do termo grego mousikē, que significa “a arte das musas”. As musas eram as deusas que guiavam e inspiravam as ciências e as artes.

É importante ressaltar que Pitágoras, grande filósofo grego, foi o responsável por estabelecer relações entre a matemática e a música, descobrindo as notas e os intervalos musicais.

Sabe-se que na Roma Antiga, muitas manifestações artísticas foram heranças da cultura grega, como a pintura e a escultura. Supõe-se, dessa forma, que o mesmo ocorreu com a música. Entretanto, diferente dos gregos, os romanos usufruíam dessa arte de maneira mais ampla e cotidiana.

Música na Idade Média

Pintura exibindo cantores medievais

Durante a Idade Média a Igreja Católica esteve bastante presente na sociedade europeia e ditava a conduta moral, social, política e artística.

Naquela época, a música teve uma presença marcante nos cultos católicos. O Papa Gregório I – século VI – classificou e compilou as regras para o canto que deveria ser entoado nas cerimônias da Igreja e intitulou-o como canto gregoriano.

Outra expressão musical do período que merece destaque são as chamadas Cantigas de Santa Maria, que agregam 427 composições produzidas em galego-português e divididas em quatro manuscritos.

Uma importante compositora medieval foi Hidelgard Von Bingen, também conhecida como Sibila do Reino.

Música no Renascimento

Pintura de Gerard van Honthorst (1623) retratando músicos no Renascimento

Já na época renascentista – que compreende o século XIV até o século XVI – a cultura sofreu transformações e os interesses estavam voltados para a razão, a ciência e o conhecimento do próprio ser humano.

Tais preocupações se refletiram também na música, que apresentava características mais universais e buscava se distanciar dos costumes da Igreja.

Uma característica significativa da música nesse período foi a polifonia, que compreende a combinação simultânea de quatro ou mais sons.

Podemos citar como um grande compositor da Renascença Thomas Weelkes.

Música no Barroco

O compositor italiano Antonio Vivaldi foi um grande expoente da música barroca

A partir do século XVII, o movimento barroco promove mudanças marcantes no cenário musical.

Foi um período bastante fértil e importante para a música ocidental e apresentava novos contornos tonais, com a utilização do modo jônico (modo “maior”) e modo eólio (modo “menor”).

O surgimento das óperas e das orquestras de câmaras também acontece nessa fase, assim como o virtuosismo dos músicos ao tocar os instrumentos. Os maiores representantes da música barroca foram Antonio Vivaldi, Johann Sebastian Bach, Domenico Scarlatti, entre outros.

Música no Classicismo

Retrato dos artistas Haydn, Mozart e Beethoven

No Classicismo, que corresponde ao período em torno de 1750 e 1830, a música adquire objetividade, equilíbrio e clareza formal, conceitos já utilizados na Grécia Antiga.

Nessa época, a música instrumental e as orquestras ganham ainda mais destaque. O piano toma o lugar do cravo e novas estruturas musicais são criadas, como a sonata, a sinfonia, o concerto e o quarteto de cordas.

Os artistas que se sobressaíram são Haydn, Mozart e Beethoven.

Música no Romantismo

Pintura retratando o compositor Fréderic Chopin

No século XIX, o movimento cultural que surgiu na Europa foi o Romantismo. A música predominante tinha como qualidades a liberdade e a fluidez, e primava também pela intensidade e vigor emocional.

Esse período musical é inaugurado pelo compositor alemão Beethoven – com a Sinfonia nº3 – e passa por nomes como Chopin, Schumann e sua esposa Clara Shumann, Wagner, Verdi, Tchaikovsky, R. Strauss, entre outros.

Música no Século XX

No século XX, a música ganha nova roupagem e uma grande transformação ocorre com o surgimento do rádio.

Novas tecnologias e suportes para a gravação e divulgação musical ajudam a popularizar essa linguagem artística e projetar cantores e compositores, já que eles não dependiam somente dos concertos musicais.

Com uma cartela de opções mais variadas, o público começa a ter contato com outros tipos de música.

É importante também destacar a presença da música atonal – ou seja, que não possui um centro tonal nem uma tonalidade preponderante. Há também a dodecafônica, que trata as doze notas da escala cromática como equivalentes.

Alguns artistas também passam a incorporar novos elementos em suas produções, como instrumentos até então pouco explorados e objetos sonoros.

Um exemplo é o multi-instrumentista brasileiro Hermeto Pascoal, que tira sons tanto de flautas e pianos como de objetos do cotidiano como chaleiras, pentes, copos d’água e brocas de dentistas. A compositora Adriana Calcanhoto também possui um projeto de música infantil que faz uso de diversos brinquedos para produzir suas composições.

Podemos citar como grandes nomes da música do século XX o brasileiro Heitor Villa-Lobos, o russo Igor Stravinsky, o nigeriano Fela Kuti, a pianista carioca Chiquinha Gonzaga, o norte-americano Louis Armstrong, a francesa Lili Boulanger, o argentino Astor Piazzolla, e muitos outros.

AIDAR, Laura. História da Música. Toda Matéria[s.d.]. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/historia-da-musica/. Acesso em: 25 abr. 2024

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Amarna

Como vocês já devem ter percebido, eu gosto de Egiptologia! Um assunto fascinante, por isso estou estudando para ser um Egiptólogo Amador. Como o Egito foi uma das primeiras civilizações do planeta, e durou mais de 3 mil anos (a nossa civilização atual, tem cerca de 2 mil anos), influenciou muito as nossas atuais religiões e aguçou a nossa mente, com uma série de possibilidades extraterrestres, dentre outras.

Vamos lá, falar um pouco mais da cidade criada por Amenophis IV, que então trocou de nome para Akenáton, e foi o pai do conhecido Tutankamon, que na verdade chamava-se, na época, Tutankaton!!!

Akhenaton e a Família Real abençoados por Aton

Amarna é o nome arábico moderno para o sítio da antiga cidade egípcia de Akhetaton, capital do país durante o reinado de Akhenaton (1353-1336 a.C.). É conhecido oficialmente como Tell el-Amarna, assim denominado por causa da tribo Beni Amran, que vivia na área quando se descobriu o sítio.

Um “tell”, em arqueologia, é um outeiro criado pelos remanescentes de sucessivas habitações humanas de uma área num dado número de anos. Como cada nova geração constrói nas ruínas da anterior, seus edifícios ficam mais elevados e se cria uma colina artificial. Amarna difere do “tell” costumeiro por não ter caído diante de um poder estrangeiro ou terremoto e nunca mais ser reconstruída na Antiguidade; em vez disso, acabou destruída por ordem do faraó Horemheb (c. 1320-1292 a.C.), que buscou apagar o nome e realizações de Akhenaton dos anais da história; depois disso, suas ruínas permaneceram na planície às margens do Rio Nilo por séculos e, gradualmente, o local recebeu novas construções dos que viviam nas redondezas.

Quando chegou ao poder, Akhenaton era um rei poderoso, encarregado – como todos os soberanos egípcios – com a manutenção de ma’at (harmonia e equilíbrio) na terra. Ma’at, um valor central da cultura do país, dava condições para que todos os aspectos da vida funcionassem harmoniosamente como deveriam. Surgiu no início da criação e desta forma, naturalmente, a observância e manutenção de ma’at pelo rei dependia fortemente na veneração adequada dos deuses conforme os tradicionais ritos e rituais.

O ÚNICO DEUS VERDADEIRO PARA AKHENATON ERA A LUZ, A LUZ DO SOL, QUE SUSTENTAVA TODA A VIDA.

Embora Akhenaton, de início, tenha mantido esta prática, por volta do quinto ano de seu reinado (c. 1348 a.C.), ele aboliu a antiga religião egípcia, fechou os templos e impôs sua própria visão monoteísta ao povo. Esta inovação, embora saudada por monoteístas das últimas centenas de anos, prejudicou a economia egípcia (que dependia muito dos templos), distraiu o rei das relações exteriores, estagnou o exército e resultou em significativas perda do status do Egito junto às nações vizinhas.

Por estas razões, o filho e sucessor de Akhenaton, Tutankhamon (ou Tutancâmon, c. 1336-1327 a.C.), fez o Egito retornar às práticas religiosas tradicionais e rejeitou o monoteísmo paterno. Não viveu o suficiente para completar a restauração do país, porém, o que ficou a cargo de Horemheb. Esta era da história egípcia é conhecida como Período de Amarna, geralmente datada desde as reformas de Akhenaton até o reinado de Horemheb: c. 1348 – c. 1320 a.C.

A Cidade do Deus

O deus que Akhenaton escolheu para substituir todos os demais não era uma criação sua. Aton, uma divindade solar menor, personificava a luz do sol. O egiptólogo David P. Silverman destaca que Akhenaton nada mais fez do que elevar este deus ao nível de divindade suprema e atribuir a ele as qualidades anteriormente associadas com Amon, mas sem nenhuma das suas características pessoais. Silverman escreve:

Ao contrário das divindades tradicionais, este deus não podia ser retratado: o símbolo do disco solar com raios, dominando a arte de Amarna, é nada mais do que uma versão em larga escala do hieróglifo para “luz”. (128)

O único deus verdadeiro de Akhenaton era a luz, a luz do sol, que sustentava toda a vida. Diferente dos outros deuses, Aton situava-se acima das preocupações mundanas e não possuía fraquezas humanas. Como Akhenaton expressa em seu Grande Hino a Aton, este deus não podia ser ciumento, deprimido, raivoso ou agir num impulso; ele simplesmente existia e, por esta condição, concedia existência a tudo o mais. Um deus tão poderoso e admirável não podia ser adorado em qualquer templo de outros deuses nem em qualquer cidade que tivesse sediado a adoração de outras divindades; ele requeria uma nova cidade, construída unicamente para honrá-lo e venerá-lo.

Estela de Akhenaton

A cidade era Akhetaton, erguida a meio caminho entre as capitais tradicionais de Mênfis, ao norte, e Tebas, ao sul. Estelas fronteiriças, instaladas a intervalos em torno de seu perímetro, contavam a história de sua fundação. Numa delas, Akhenaton registra a natureza do local que escolheu:

Vejam, é o Faraó que a encontrou – não sendo a propriedade de um deus, não sendo a propriedade de uma deusa, não sendo a propriedade de um governante masculino, não sendo a propriedade de uma governante feminina, não sendo a propriedade de ninguém. (Snape, 155)

Outras estelas e inscrições deixam claro que a fundação da cidade foi uma iniciativa de Akhenaton como indivíduo, não como rei do Egito. Um faraó do Novo Império do Egito (c. 1570 – c. 1069 a.C.) determinaria a construção de um edifício ou templo de uma cidade, ou a instalação de obeliscos e monumentos em seu nome real e para a glória de seu deus particular, mas estes projetos deveriam beneficiar a nação como um todo, não apenas o rei. A cidade de Akhenaton foi construída com o único propósito de proporcionar-lhe um elaborado distrito sagrado para seu deus.

Projeto e Traçado

Akhetaton estendia-se por mais de seis milhas na margem leste do Nilo, entre a orla e os despenhadeiros sobre Assiute. Algumas estelas fronteiriças foram esculpidas diretamente no despenhadeiro, enquanto outras se erguiam nos lados mais distantes da cidade. Os quatro distritos principais eram a Cidade Norte, Cidade Central, Subúrbios Meridionais e a Periferia; não se usavam estes nomes na Antiguidade.

A Cidade Norte estendia-se em torno do Palácio Norte, onde se recebiam os convidados e adorava-se Aton. A família real vivia em apartamentos nos fundos do palácio e os salões mais opulentos, pintados com cenas exteriores retratando a fertilidade da região do Delta, estavam dedicados a Aton que, segundo se acreditava, vivia neles. O palácio não tinha telhado – uma característica comum dos prédios em Akhetaton –, como um gesto de boas-vindas à divindade.

Palácio Norte de Amarna

A Cidade Central situava-se em torno do Grande Templo de Aton e o Pequeno Templo de Aton. Nela se encontrava o núcleo burocrático da cidade, onde os administradores trabalhavam e viviam. Os Subúrbios Meridionais abrigavam o distrito residencial para a elite mais abastada e apresentavam grandes propriedades e monumentos. Na Periferia viviam os camponeses, que trabalhavam os campos, construíam e cuidavam das tumbas próximas da necrópole.

O próprio Akhenaton projetou a cidade para seu deus, como as estelas fronteiriças deixam claro, e recusou sugestões ou conselhos de qualquer um, inclusive da esposa, Nefertiti (c. 1370 – c. 1336 a.C.). Precisamente qual tipo de sugestões feitas por ela não se sabe, mas o fato de Akhenaton fazer questão de declarar que não ouviu seus conselhos parece indicar que eram significativos. O egiptólogo Steven Snape comenta:

É óbvio que o “prospecto” da nova cidade, esculpido nas estelas fronteiriças, está profundamente preocupado em descrever as provisões que seriam feitas para o rei, sua família imediata, o deus Aton e aqueles funcionários religiosos que estavam envolvidos com o culto. É igualmente óbvio que ignora completamente as necessidades da vasta maioria da população de Amarna, pessoas que teriam sido transferidas (possivelmente contra a vontade) de seus lares para habitar a nova cidade. (158)

Uma vez que Akhenaton transferiu sua capital para Akhetaton, ele concentrou sua atenção na veneração a Aton e, cada vez mais, deixou de lado os assuntos de estado, bem como as condições de vida além dos limites da cidade, num país que estava caindo em declínio.

O Reinado de Akhenaton e as Cartas de Amarna

As Cartas de Amarna são tabuinhas cuneiformes descobertas em Akhetaton em 1887, por uma mulher local que cavava em busca de adubo. São correspondências entre reis do Egito e de nações estrangeiras, bem como documentos oficiais do período. A maioria destas cartas demonstra que Akhenaton se comportava como um administrador capaz quando a situação lhe interessava pessoalmente, mas, à medida que transcorria seu reinado, ele se importava menos e menos pelas responsabilidades reais.

Em uma carta, ele repreende fortemente o governante estrangeiro Abdi-Asirta (também conhecido como Aziru) por suas ações contra o rei de Biblos, Ribaddi (ou Rib-Hadda) – que foi morto – e sua amizade com os hititas, na época inimigos do Egito. Isso sem dúvida tinha mais a ver com seu desejo de manter boas relações com os estados situados entre o Egito e a Terra de Hatti – Canaã e Síria, por exemplo, que estavam sob influência de Abdi-Asirta – do que por qualquer senso de justiça pela morte de Ribaddi e a conquista de Biblos.

As Cartas de Amarna

Também não resta dúvida de que sua atenção ao problema servia aos interesses do estado mas, como outras questões similares foram ignoradas, parece que ele só tratava das questões que o afetavam pessoalmente. Akhenaton ordenou que Abdi-Asirta fosse levado ao Egito e o aprisionou durante um ano, até que os avanços hititas ao norte forçaram sua libertação, mas parece haver uma marcante diferença entre as cartas lidando com esta situação e outras correspondências em problemas semelhantes.

Embora haja exemplos como este, no qual Akhenaton trata de assuntos de estado, existem muitos mais trazendo evidências de seu desinteresse por qualquer coisa que não fossem suas reformas religiosas e a vida no palácio. Deve ser observado, porém, que este é um ponto com frequência – e ardentemente – debatido entre acadêmicos nos tempos modernos, como de resto ocorre com todo o assim chamado Período de Amarna do governo de Akhenaton. Com referência a isso, Dr. Zahi Hawass escreve:

Escreveu-se mais sobre este período da história egípcia do que qualquer outro, e sabe-se que estudiosos têm brigado, ou pelo menos levados a episódios flagrantes de indelicadeza, sobre suas opiniões conflitantes. (35)

A preponderância da evidência, tanto das cartas de Amarna quanto de um decreto posterior de Tutankhamon, bem como indicações arqueológicas, sugerem fortemente que Akhenaton foi um governante bastante ruim no que se refere aos seus súditos e estados vassalos e seu reinado, nas palavras de Hawass, representou “um regime focado para dentro que perdeu todo o interesse em sua política externa” (45).

Akhenaton via-se e à sua esposa não somente como servos dos deuses, mas como encarnações da luz de Aton. A arte do Período de Amarna retrata a família real estranhamente alongada e fina e, ainda que isso tenha sido interpretado por alguns como “realismo”, é bem mais provável um propósito simbólico. Para Akhenaton, o deus Aton era diferente de todos os outros – invisível, todo-poderoso, onisciente e transformativo – e a arte do período parece refletir esta crença nas figuras curiosamente altas e magras representadas: eles teriam sido transformados pelo toque de Aton.

Destruição da Cidade

A cidade prosperou até a morte de Akhenaton; depois disso, Tutankhamon transferiu a capital de volta para Mênfis e então para Tebas. O novo faraó deu início às medidas para reverter as políticas paternas e devolver ao Egito as antigas crenças e práticas religiosas que haviam mantido e ajudado a desenvolver sua cultura por quase 2.000 anos. Os templos foram reabertos, assim como os negócios que dependiam deles.

Tutankhamon morreu antes que pudesse finalizar estas reformas, que prosseguiram com seu sucessor, o antigo vizir, Ay, e então por Horemheb. Este último, um general sob Akhenaton, o havia servido fielmente, mas discordava veementemente das suas reformas religiosas. Quando Horemheb assumiu o trono, Akhetaton ainda permanecia de pé (como demonstrado por um santuário dedicado a ele e construído naquela época), mas não continuaria intacta por muito tempo. O faraó ordenou que a cidade fosse arrasada e os remanescentes utilizados como entulho em seus próprios projetos.

Relevo de Horemheb

Horemheb dedicou-se com tanto empenho a apagar o nome e realizações de Akhenaton que este não aparece em nenhum registro histórico posterior do Egito. Quando era citado é somente como “o herético de Akhetaton”, mas nunca nomeado e sem nenhuma referência à sua posição como faraó.

Descoberta e Preservação

As ruínas da cidade foram mapeadas e desenhadas inicialmente no século XVIII pelo padre francês Claude Sicard. Outros europeus visitaram o local posteriormente e o interesse na área aumentou após a descoberta das Cartas de Amarna. Houve explorações e mapeamentos adicionais no final do século XVIII pelo corpo de engenheiros de Napoleão, durante sua campanha egípcia, e seu trabalho atraiu a atenção de outros arqueólogos após a decifração da Pedra de Rosetta, que permitiu a leitura dos hieróglifos a partir de c. 1824. Assim, o nome de Akhenaton passou a ser conhecido, mas não seu significado histórico. Somente quando arqueólogos descobriram, no início do século XX, as ruínas que Horemheb havia utilizado como entulho que a história de Akhenaton começou finalmente a ser descoberta.

Atualmente, o sítio traz uma área ampla e árida de fundações em ruínas, preservadas e escavadas pelo Projeto Amarna. Ao contrário das ruínas de Tebas ou da vila de Deir el-Medina, pouco subsistiu de Akhetaton para um visitante admirar. O egiptólogo Steven Snape comenta que “além das reconstruções modestas de partes da cidade por arqueólogos modernos, não há virtualmente nada para ser visto da cidade de Amarna” (154). Não se trata de algo incomum, pois cidades como Mênfis e Per-Ramsés, ambas também capitais do antigo Egito – bem como muitas outras – atualmente não passam de extensões desoladas, com muito menos monumentos do que aqueles que sobreviveram em Amarna.

O que faz Amarna um caso especial neste aspecto é que a cidade não acabou sendo destruída pelo tempo ou por um exército invasor, mas pelo sucessor do rei que a construiu. Em nenhuma outra época da história do antigo Egito o sucessor de um rei arrasou uma cidade para apagar completamente seu nome. Remover o nome de alguém de um templo, monumento ou túmulo o condenava por toda a eternidade, mas, neste caso, somente a remoção da cidade inteira satisfaria o senso de justiça de Horemheb.

Os egípcios acreditavam que era preciso ser lembrado pelos vivos para continuar a eterna jornada na vida além-túmulo. No caso de Akhenaton, não seria somente um túmulo ou templo que foi desfigurado, mas a totalidade de sua vida e reinado. Todos os seus monumentos situados nas cidades egípcias acabaram derrubados e cada inscrição portando seu nome ou de seu deus terminou editada com cinzéis. Considerou-se a heresia de Akhenaton tão séria, e os danos feitos ao país tão severos, que se acredita que ele obteve a pior punição que se podia conceber no antigo Egito: a não-existência.

Bibliografia

Mark, Joshua J.. “Amarna.” Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. Última modificação Agosto 01, 2017. https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-12780/amarna/.

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Texto de Luis Veríssimo – Operado de hemorroidas

Agora, um pouco de humor pois ninguém é de ferro

Texto engraçadíssimo do Luís Veríssimo

“Ptolomeu em 150 d.C. falava que a terra era o centro do universo e que tudo girava em torno dela, foram precisos cerca de 1400 anos para esta teoria ser rebatida por Nicolau Copérnico provando para a humanidade que o Sol sim era o centro.”

Eu. Simplesmente eu, descobri em apenas três dias, após 56 anos, que ambos estavam redondamente enganados: o centro do universo é o cu.

Isso mesmo, o cu!

Operei de hemorroidas em caráter de urgência algumas semanas atrás. No domingo à noitinha, o que achava que seria um singelo peidinho, quase me virou do avesso.

“É difícil, mas vamos ver se reverte”, falou meu médico.

Reverteu merda nenhuma, era mais fácil o Lula aceitar que sabia do mensalão do que aquela lazarenta bolinha (?) dar o toque de recolher.

Foram quase 2 horas de cirurgia e confesso não senti nadica de nada, nem se me enrabaram durante minha letargia! Dois dias de hospital, passei bem embora tenham tentado me afogar com tanto soro que me aplicaram, foram litros e litros; recebi alta e fui repousar em casa.

Passados os efeitos anestésicos e analgésicos, vem a “primeira vez”.

PUTA QUI PARIU!!! Parece que você está cagando um croquete de figo da Índia, casca de abacaxi, concha de ostra e arame farpado. É um autoflagelo.

Parece que você tá cagando uma briga de 5 gatos, sai arranhando tudo.
Caguei de pé, pois sentado achei que o cú ia junto…

Por uns três dias dói tanto que você não imagina uma coisinha tão pequena e com um nome tão reduzido (cu) possa doer tanto. O tamanho da dor não é proporcional ao tamanho do nome, neste caso, cu deveria chamar dobrovosky, tegulcigalpa, nabucodonosor.

Passam pela cabeça soluções mágicas: Usar um ventilador! Só se for daqueles túneis aerodinâmicos. Gelo! Só se eu escorregar pelado por uma encosta do Monte Everest. Esguichinho d’água! Tem que ser igual a da Praça da Matriz, névoa seguida de jatos intercalados.

Descobri também que somos descendentes diretos do babuíno, porque você fica andando como macaco e com o cu vermelho; qualquer tosse, movimento inesperado, virada mais brusca o cu dói, e como!

Para melhorar as “idas” à privada, recomenda-se dieta na base de fibras, foi o que fiz: comi cinco vassouras piaçaba, um tapete de sisal e sete metros de corda.

Agora sei o sentido daquela frase: “quem tem medo de cagar não come! “Perdi 4 quilos; 3,5 de gordura e 0,5 de cu. Tudo valeu, agora já estou bem, cagando como manda o figurino, não preciso pensar para peidar, o cu ficou afinado em Si Bemol menor, uma beleza! A foda é que usei Modess (vulgo penso higiénico) por 20 dias após a cirurgia e hoje tô sentindo falta dele!”

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Alexandre, o Grande

Alexandre III da Macedônia

Mosaico de Alexandre, o Grande, e Bucéfalo

Alexandre III da Macedônia, mais conhecido como Alexandre, o Grande (v. 21 de julho de 356 – 10 ou 11 de Junho de 323 a.C., r. 336-323 a.C.) era filho do Rei Filipe II da Macedônia (r. 359-336 a.C.). Ele ascendeu ao trono com a morte do pai, em 336 a.C., e conquistou a maior parte do mundo conhecido na época.

Alexandre, o Grande (Reconstituição Facial) – Arienne King (CC BY-NC-SA)

É chamado de “o Grande” tanto por seu gênio militar quanto pelo talento diplomático em lidar com as várias populações das regiões que conquistou. Alexandre disseminou a cultura, linguagem e pensamento gregos pela Ásia Menor, Egito, Mesopotâmia e até a Índia, assim iniciando a era do Período Helenístico (323-21 a.C.). Este processo continuou com quatro de seus generais (seus sucessores, conhecidos como Diádocos) que, durante as guerras pela supremacia, continuaram sua política de integração da cultura grega (helenística) com a do Oriente Próximo. Ele morreu de causas desconhecidas em 323 a.C., sem ter nomeado claramente um sucessor (ou, de acordo com alguns relatos, sua escolha do comandante Pérdicas teria sido ignorada) e o império que construiu foi dividido entre os Diádocos.

As campanhas de Alexandre tornaram-se lendárias, influenciando as táticas e carreiras de generais gregos e romanos posteriores, bem como inspirando numerosas biografias posteriores que lhe atribuíram um status semidivino. Os historiadores modernos adotam uma abordagem mais crítica em relação à sua vida e carreira, como demonstrado pela crítica à destruição de Persépolis e ao tratamento dispensado aos cidadãos de Tiro. Porém, o consenso geral referente ao seu legado, entre os estudiosos ocidentais, de qualquer forma, permanece em sua maior parte positivo e Alexandre continua sendo uma das personagens mais populares e reconhecíveis da história mundial.

A Juventude de Alexandre

Quando Alexandre era jovem, foi ensinado a lutar e montar a cavalo por Leônidas do Épiro, um parente de sua mãe, Olímpia, assim como a suportar privações típicas de soldados, tais como marchas forçadas. Seu pai, Filipe, estava interessado em criar um futuro rei refinado e, assim, contratou Lisímaco de Acarnânia para ensinar ao garoto a ler, escrever e tocar a lira. Esta educação instilaria em Alexandre um amor duradouro pela leitura e música. Com a idade de 13 ou 14 anos, ele conheceu o filósofo grego Aristóteles (v. 384-322), que Filipe havia contratado como um tutor particular. Seus estudos com Aristóteles durariam até os 16 anos e acredita-se que mantiveram uma correspondência durante todas as campanhas posteriores de Alexandre, embora não haja evidências concretas a respeito.

A influência de Aristóteles manteve-se no relacionamento com os povos que conquistou, pois Alexandre jamais impôs a cultura grega sobre os habitantes das várias regiões subjugadas, mas apenas a apresentava, da mesma forma que o filósofo usava para ensinar seus alunos. A influência de Leônidas pode ser verificada na duradoura resiliência e energia física de Alexandre, bem como em sua habilidade como cavaleiro. Conta-se que ele domou o “incontrolável” Bucéfalo quando tinha apenas 11 ou 12 anos.

Seus tutores certamente exerceram uma profunda influência sobre ele, mas Alexandre parecia destinado à grandeza desde o nascimento. Ele teve, em primeiro lugar, um pai cujas realizações proporcionaram uma base sólida para seus sucessos posteriores. O historiador Diodoro Sículo observa:

Durante os vinte e quatro anos de seu reinado na Macedônia, que ele iniciou com recursos bastante escassos, Filipe transformou seu reino em um dos maiores poderes da Europa […] Ele projetou a derrubada do Império Persa, desembarcou forças na Ásia e estava no processo de libertar as comunidades helenísticas quando foi interrompido pelo Destino – a despeito do qual, ele deixou de herança uma força militar de tal tamanho e qualidade que seu filho Alexandre foi capaz de derrotar o Império Persa sem requerer a assistência de aliados. Estas realizações não aconteceram pela ação da Fortuna, mas pela sua própria força de caráter, pelo que este rei se eleva sobre todos os outros pela sua perspicácia militar, coragem pessoal e brilhantismo intelectual. (Livro XVI.ch.1)

Ainda que claramente seu pai tenha tido um grande impacto sobre ele, o próprio Alexandre escolheu acreditar que seu sucesso se devia a forças divinas. Chamava-se filho de Zeus e, assim, reivindicava o status de um semideus, ligando sua linhagem aos seus heróis favoritos da Antiguidade, Aquiles e Hércules, e modelando seu comportamento neles. Esta crença foi instilada nele por Olímpia, que chegou a afirmar ter sido engravidada pelo próprio Zeus, ou seja, Alexandre teria nascido de uma concepção virginal. Grandes sinais e presságios marcaram seu nascimento, tais como uma estrela brilhante resplandecendo sobre a Macedônia naquela noite e a destruição do Templo de Ártemis, em Éfeso. Plutarco escreve:

Alexandre nasceu no sexto dia de Hecatombaeon, o mês que os macedônios chamam Lous, o mesmo dia em que o templo de Diana, em Éfeso, foi incendiado; como testemunha Hegésias de Magnésia, que faz disso uma ocorrência tão fria que teria sido suficiente para extinguir o incêndio do templo. O templo, diz ele, pegou fogo e foi destruído enquanto sua senhora estava ausente, ajudando no nascimento de Alexandre. Todos os adivinhos orientais que estavam na ocasião em Éfeso, buscando nas ruínas do templo um sinal de alguma outra calamidade, correram pela cidade, golpeando os próprios rostos e gritando que este dia havia trazido alguma coisa que se mostraria fatal e destrutiva para toda a Ásia. (Plutarco, Vida de Alexandre, I)

NO ORÁCULO DE SIWA, ELE FOI PROCLAMADO FILHO DO DEUS ZEUS-AMON.

Embora seu nascimento esteja bem documento pelos historiadores, há pouca informação sobre sua juventude, além das fábulas sobre sua precocidade (ele teria interrogado dignatários que visitavam a Macedônia sobre as fronteiras e pontos fortes da Pérsia quando tinha sete anos), seus tutores e amigos de infância. Os amigos de Alexandre – Cassandro (v.c. 355-297 a.C.), Ptolomeu (v.c. 367-282 a.C.) e Heféstion (v.c. 356-324 a.C.), tornariam-se companhias de toda a vida e generais em seu exército.

Calístenes (v.c. 360-327 a.C.), outro amigo, era sobrinho-neto de Aristóteles e veio para a corte macedônia com o filósofo. Mais tarde, atuaria como historiador da corte e acompanharia Alexandre em campanha. Heféstion permaneceu seu melhor e mais querido amigo através de toda a vida, além de segundo em comando no exército. Sobre a juventude de Alexandre, o historiador Worthington afirma que Alexandre “seria educado em casa, como era costume na Macedônia e cresceria acostumado a assistir (e então participar) nas competições etílicas, parte da vida na corte”, mas que, à parte essas informações, “sabemos surpreendentemente pouco sobre a infância de Alexandre” (33).

Queroneia e Campanhas Iniciais

O talento militar de Alexandre começou a ser notado na Batalha de Queroneia, em 338 a.C. Ainda que com apenas 18 anos, ele ajudou reverter o rumo da batalha nesta vitória decisiva dos macedônios, que derrotaram cidades-estados gregas aliadas. Quando Filipe II foi assassinado, em 336 a.C., Alexandre assumiu o trono e, com as cidades-estados gregas agora unidas sob o poder macedônio após Queroneia, iniciou a grande campanha que seu pai havia planejado: a conquista do poderoso Império Persa. Worthington declara:

Homero era a bíblia de Alexandre e ele levou a edição de Aristóteles com ele para a Ásia […]. Durante suas campanhas, Alexandre sempre procurava descobrir tudo o que podia sobre as regiões pelas quais passava. Levou com ele uma comitiva de estudiosos para registrar e analisar tais informações sobre botânica, biologia, zoologia, meteorologia e topografia. Seu desejo de aprender e ter os dados registrados tão cientificamente quanto possível, provavelmente resultaram dos ensinamentos e entusiasmo de Aristóteles. (34-35)

Com um exército macedônio de 32.000 homens na infantaria e 5.100 na cavalaria, Alexandre fez a travessia para a Ásia Menor em 334 a.C. e começou sua conquista do Império Persa Aquemênida, derrotando um exército liderado por sátrapas na Batalha de Grânico, em maio. Ele então “libertou” (como classificava suas conquistas) as cidades de Sardis e Éfeso do domínio persa no mesmo ano, antes de se dirigir a outras da Ásia Menor. Em Éfeso, ofereceu-se para reconstruir o Templo de Ártemis, que havia sido destruído por um incêndio na noite de seu nascimento, mas a cidade rejeitou a proposta. Em 333 a.C., Alexandre e suas tropas derrotaram um exército maior, liderado pelo próprio Rei Dário III da Pérsia (r. 336-330 a.C.), na Batalha de Issos. Ele continuou e saqueou as cidades fenícias de Baalbek e Sidon (que tinha se rendido) em 332 a.C., e então sitiou a cidade insular de Tiro.

Tão determinado estava em conquistar a antiga cidade que construiu um caminho elevado da terra firme até a ilha, no qual montou suas máquinas de sítio. Este caminho aumentou progressivamente, graças ao acúmulo de lama e terra, e esta é a razão pela qual Tiro faz parte do continente, no atual Líbano. Como punição pela teimosa resistência, os habitantes da cidade foram massacrados e os sobreviventes vendidos como escravos. Esta decisão referente aos cidadãos de Tiro é citada por historiadores, tanto antigos como modernos, como um exemplo básico do caráter implacável de Alexandre quando desafiado.

Em 331 a.C., conquistou o Egito e fundou a cidade de Alexandria. No Oráculo de Siwa, situado no oásis egípcio homônimo, foi Alexandre foi proclamado filho do deus Zeus-Amon.

Busto de Bronze de Alexandre, o Grande

As Campanhas Persas

Em 331 a.C., Alexandre reencontrou o Rei Dário III no campo de batalha em Gaugamela (também chamada de Batalha de Arbela) onde, novamente em grande inferioridade numérica, derrotou decisivamente o soberano persa, que fugiu do combate. Babilônia e Susa renderam-se incondicionalmente, sem resistência. No inverno de 330 a.C., Alexandre marchou sobre Persépolis, encontrando oposição na Batalha dos Portões Persas, defendidos pelo herói Ariobarzanes (v. 386-330 a.C.) e sua irmã, Youtab Aryobarzan (d. 330 a.C.), no comando das tropas. O rei macedônio os derrotou e tomou Persépolis, que então foi destruída pelo fogo.

De acordo com o antigo historiador Diodoro Sículo (e outras fontes da Antiguidade), o próprio Alexandre iniciou o fogo, que destruiu o palácio principal e a maior parte da cidade, como vingança pelo incêndio da Acrópole, em Atenas, durante a invasão do rei persa Xerxes, em 480 a.C. Esta ação teria sido instigada por Taís, a amante ateniense do general Ptolomeu, durante uma festa de bêbados, com a afirmação de que seria uma vingança adequada se a cidade fosse queimada “pelas mãos de uma mulher”. Conta-se que ela teria atirado sua tocha logo após Alexandre ter jogado a primeira.

No verão de 330 a.C., Dário III foi assassinado por seu próprio general e primo, Besso, uma atitude que Alexandre teria reprovado. O cadáver de Dário III foi tratado com o maior respeito, assim como os membros sobreviventes da sua família. Alexandre proclamou-se Rei da Ásia e continuou com sua conquista, marchando para o interior do atual Afeganistão. Em 329 a.C., fundou a cidade de Alexandria-Escate no Rio Iaxartes, destruiu a cidade de Cirópolis e derrotou os citas nas fronteiras setentrionais do império. Entre o outono de 330 a.C. e a primavera de 327 a.C., lutou contra Báctria (Báctria foi uma província do Império Persa, localizada onde hoje se encontram o Afeganistão, Uzbequistão e Tajiquistão) e Sogdiana, em duros combates que terminou vencendo, como havia ocorrido com cada batalha até o momento. Besso acabou capturado e executado pela traição contra o rei persa, numa mensagem clara de que deslealdades deste tipo não seriam toleradas.

Durante este período, Alexandre fundou muitas cidades que levavam seu nome para solidificar a imagem não somente de “libertador”, mas como a de um deus, adotando também o título Shahanshah (Rei dos Reis), usado pelos governantes do Primeiro Império Persa. Em consequência deste status, ele introduziu o costume persa da proskynesis ao exército, segundo o qual aqueles que se dirigiam a ele deveriam em primeiro lugar ajoelhar-se e beijar sua mão.

As tropas macedônias ficaram cada vez mais desconfortáveis com a aparente deificação de Alexandre e a adoção de costumes persas. Conspirações de assassinato foram planejadas (principalmente em 327 a.C.), mas terminaram descobertas e os conspiradores executados, mesmo que fossem velhos amigos. Calístenes tornou-se um deles, ao ser implicado numa das conspirações. Cleito, o velho político que havia salvo a vida de Alexandre na Batalha de Grânico, acabaria condenado de forma semelhante. Em c. 327 a.C., Alexandre desfez-se tanto de Calístenes quanto de Cleito, em incidentes separados, por traição e por questionar sua autoridade, respectivamente.

O hábito de Alexandre de beber em excesso era bem conhecido e, no caso da morte de Cleito, certamente influenciou de forma significativa o assassinato. Tanto Cleito quanto Calístenes haviam se tornado críticos abertos da adoção dos costumes persas pelo rei. Embora capaz de grande diplomacia e habilidade em lidar com os povos conquistados e seus governantes, Alexandre não era conhecido por tolerar opiniões pessoais que conflitavam com as suas próprias, uma tendência só exacerbada quando bebia. A morte de Cleito foi rápida, através de uma lança que Alexandre atirou contra ele, enquanto Calístenes foi preso e morreu durante o confinamento.

Mapa das Conquistas de Alexandre, o Grande

Índia e Motim

Em 327 a.C., com o Império Persa firmemente sob seu controle e recém-casado com a nobre bactriana Roxana (v. c. 340-c. 310 a.C.), Alexandre voltou sua atenção para a Índia. Após tomar conhecimento das façanhas do grande general macedônio, o rei indiano Omphis de Taxila submeteu-se à sua autoridade sem luta, mas as tribos Aspasioi e Assakenoi resistiram ferozmente. Em batalhas realizadas de 327 a 326 a.C., Alexandre subjugou estas tribos, e finalmente defrontou-se com o Rei Poro de Paurava na Batalha do Rio Hidaspes, em 326 a.C.

Poro atacou as forças de Alexandre com elefantes e lutou tão bravamente com suas tropas que, após derrotá-lo, Alexandre o nomeou governante de uma região maior do que a que havia reinado anteriormente. Seu cavalo predileto, Bucéfalo, foi morto nesta batalha e Alexandre chamou uma das duas cidades que fundou após o combate como “Bucéfala” em homenagem ao animal.

Alexandre pretendia marchar e cruzar o Rio Ganges em direção a futuras conquistas, mas suas tropas, esgotadas após o duro combate contra Poro (no qual, de acordo com Arriano, teriam sido perdidos 1.000 homens), amotinaram-se em 326 a.C. e se recusaram a ir adiante. O rei tentou persuadir seus homens a prosseguir, mas, falhando em convencê-los, finalmente concordou com seus desejos. Ele dividiu o exército em dois, enviando metade de volta a Susa pelo mar, através do Golfo Pérsico, sob o comando do Almirante Nearco, e marchou com a outra metade através do Deserto Gedrosiano em 325 a.C., quase um ano depois do motim das tropas.

As justificativas por trás desta decisão, tanto em adiar a retirada após o motim e a forma como finalmente ocorreu, não estão claras e ainda são debatidas pelos historiadores. Mesmo que tivesse abandonado sua conquista da Índia, Alexandre ainda interrompia sua marcha para subjugar as tribos hostis que encontrava pelo caminho. O áspero terreno do deserto e os combates cobraram seu preço e, quando alcançou Susa, em 324 a.C., Alexandre tinha sofrido baixas consideráveis em suas tropas.

Após seu retorno, descobriu que muitos sátrapas a quem havia confiado o governo tinham abusado do seu poder e, assim, os executou, assim como aqueles que haviam vandalizado a tumba de Ciro, o Grande (r. c. 550-530 a.C.), na velha capital de Pasárgada. Ele ordenou que a antiga capital e a tumba fossem restauradas e tomou outras medidas para integrar seu exército com os povos da região, mesclando as culturas persa e macedônia.

O rei presidiu uma cerimônia de casamento coletivo em Susa, em 324 a.C., na qual uniram-se membros mais proeminentes do seu staff com princesas e nobres persas, enquanto ele mesmo se casou com uma filha de Dário III para consolidar sua identidade com a realeza persa. Muitos em suas tropas objetavam a esta fusão cultural e criticavam cada vez mais a adoção de vestimentas persas e os maneirismos que vinha adotando desde 329 a.C. Também resistiam à promoção de persas no lugar de macedônios nos exércitos e à ordem do rei de fundir unidades macedônias e persas. Alexandre respondeu nomeando persas para posições proeminentes no exército e concedendo títulos e honrarias tradicionais macedônias às unidades persas.

Suas tropas recuaram e se submeteram aos desejos de Alexandre e, num gesto de boa vontade, ele devolveu os títulos aos macedônios e ordenou uma grande festa comunal, na qual jantou e bebeu com o exército. Alexandre já havia abandonado a obrigatoriedade do costume da proskynesis, em deferência a seus homens, mas continuou a se comportar como um rei persa, em vez de macedônio.

Por volta desta época, em 324 a.C., Heféstion, amigo de toda a vida, possivelmente amante, e também segundo em comando de Alexandre, morreu de uma febre, embora alguns relatos sugiram que ele pode ter sido envenenado. A alegação de que Alexandre era homossexual ou bissexual aparece em biografias escritas após sua morte e Heféstion é rotineiramente indicado como seu amante, bem como melhor amigo. Os relatos dos historiadores sobre a reação de Alexandre a este evento concordam que seu pesar foi insuportável.

Plutarco afirma que Alexandre massacrou os cosseanos de uma tribo vizinha em sacrifício a seu amigo e Arriano relata que ele mandou executar o médico de Heféstion por falhar em curá-lo. As crinas e caudas dos cavalos foram cortadas em sinal de luto e Alexandre se recusou a promover outra pessoa para a posição de Heféstion como comandante da cavalaria. Ele começou um jejum e declarou um período de luto através de todo o império, além de ritos funerários geralmente reservados a um rei.

A Morte de Alexandre

Ainda pesaroso pela morte de Heféstion, Alexandre retornou à Babilônia em 323 a.C., com planos de expandir seu império, mas jamais iria realizá-los porque morreu em 10 ou 11 de Junho de 323 a.C., aos 32 anos de idade, após sofrer com dez dias de febre alta. As teorias referentes à causa da morte variam entre envenenamento, malária, meningite e até infecção bacterial ao beber água contaminada (entre outras).

Plutarco diz que, 14 dias antes da morte, Alexandre divertiu-se com seu almirante Nearcos e seu amigo Médio de Larissa numa longa sessão de bebedeira, após a qual caiu doente com uma febre da qual não se recuperou. Quando foi perguntado sobre quem deveria sucedê-lo, Alexandre disse: “o mais forte”, resposta que levou seu império a ser dividido entre quatro de seus generais: Cassandro, Ptolomeu, Antígono e Seleuco, conhecidos como Diadochi (Diádocos) ou “sucessores”.

Sarcófago de Alexandre (detalhe)

Plutarco e Arriano, porém, alegam que ele passou seu reino para Pérdicas, o amigo de Heféstion com o qual Alexandre havia carregado seu corpo para a pira funerária na Babilônia. Pérdicas era também amigo de Alexandre, bem como seu guarda-costas e companheiro de cavalgadas. Considerando o hábito do rei de recompensar os mais próximos com favores, faz sentido que indicasse Pérdicas em detrimento aos demais. Seja como for, após a morte de Alexandre, seus generais ignoraram seus desejos e Pérdicas acabou assassinado em 321 a.C.

Os Diádocos

Seu camarada de longa data, Cassandro, ordenaria as execuções de Roxana e do filho desta com Alexandre, além de Olímpia, para consolidar o poder como o novo rei da Macedônia. Afirma-se que Ptolomeu I roubou o cadáver de Alexandre quando estava sendo transportado para a Macedônia e o levou furtivamente para o Egito, na esperança de tornar realidade uma profecia segundo a qual o lugar onde ele jazesse seria próspero e inconquistável. Ele fundaria a Dinastia Ptolemaica no Egito, que duraria até 30 a.C., terminando com a morte de sua descendente, Cleópatra VII (v. 69-30 a.C.).

Seleuco fundou o Império Selêucida (312-63 a.C.), compreendendo a Mesopotâmia, Anatólia e parte da Índia e seria o último remanescente dos Diádocos após 40 anos de incessantes guerras entre eles e seus herdeiros. Veio a ser conhecido como Seleuco I Nicator (Invencível, r. 305-281 a.C.). Nenhum dos generais de Alexandre possuía sua inteligência natural, compreensão ou gênio militar, mas, ainda assim, eles fundaram dinastias que, com exceções, governariam suas respectivas regiões até a ascensão de Roma.

Sua influência sobre estas áreas criaria o que os historiadores chamam de Período Helenístico, no qual haveria a introdução e fusão do pensamento e cultura dos gregos com os costumes destas populações. De acordo com Diodoro Sículo, uma das cláusulas do testamento de Alexandre previa a criação de um império unificado entre os antigos inimigos. Pessoas do Oriente Próximo deveriam ser encorajadas a se casar com europeus e vice-versa; assim, uma nova cultura helenística seria adotada por todos. Ainda que os Diádocos tenham falhado no atendimento pacífico aos desejos de Alexandre, a helenização de seus impérios contribuiu para o sonho de unidade cultural, mesmo que ela jamais se concretizasse completamente.

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Islamismo

Portões da Mesquista do Profeta, em Medina

O Islã é uma religião monoteísta abraâmica baseada nos ensinamentos do profeta Muhammad ibn Abdullah (570-632 d.C., [conhecido em português como Maomé] e após seu nome os muçulmanos tradicionalmente acrescentam: “que a paz esteja com ele”). Ao lado do Cristianismo e do Judaísmo, o Islamismo é também um desdobramento dos ensinamentos de Abraão (apresentado nas escrituras judaicas e cristãs, e considerado um profeta no Islã, e após seu nome os muçulmanos dizem, igualmente, “que a paz esteja com ele”), mas difere de ambos em alguns aspectos. Os adeptos do Islamismo são chamados de muçulmanos, dos quais existem cerca de dois bilhões no mundo hoje, perdendo em número apenas para os cristãos.

Após criarem raízes na Península Arábica, os seguidores de Maomé conseguiram conquistar as superpotências da época: o Império Sassânida e o Império Bizantino. Em seu auge (no ano de 750), o Império Islâmico se estendia entre o atual Paquistão, a leste, e ao Marrocos e à Península Ibérica, a oeste. Embora inicialmente tendo-se expandido por meio das conquistas, o Islã floresceria depois por meio do comércio, expandindo-se para além de suas fronteiras iniciais e ao redor do mundo. Atualmente, é a religião que mais cresce no planeta.

A Missão do Profeta

O profeta Maomé nasceu no ano 570. Ele era membro do clã Coraixita, de Banu Hashim, um grupo bastante respeitado, apesar de sua declinante riqueza. Órfão em tenra idade, foi criado por seu tio Abu Talib, que, segundo dizem, amava-o ainda mais do que a seus próprios filhos. Maomé se tornou comerciante e era conhecido por sua honestidade (o que era uma característica rara na Arábia daquela época), atraindo assim a atenção de uma viúva rica chamada Cadija, que lhe enviou uma proposta de casamento, aceita por ele, apesar de ela ser 15 anos mais velha (Maomé tinha 25 anos na época). O apoio de Cadija a Maomé foi fundamental para que o Profeta cumprisse sua missão.

MAOMÉ COMEÇOU A PREGAR A UNIDADE DE DEUS PARA SUA FAMÍLIA E AMIGOS MAIS PRÓXIMOS, E DEPOIS, PARA O PÚBLICO GERAL.

Quando próximo de seus quarenta anos, ele começou a adorar a Deus em reclusão, em uma caverna chamada Hira, na montanha Jabal al-Nour (“Montanha da Luz”), perto da cidade de Meca. Diz-se que um dia, no ano de 610, o anjo Gabriel aproximou-se dele com a primeira revelação de Deus – Alá (que significa “o Deus”). Maomé, a princípio, teria reagido negativamente à revelação – perplexo e assustado, voltou correndo para casa, tremendo de medo – mas, depois, percebeu que era um profeta de Deus.

Maomé começou a pregar a unidade de Deus para sua família e amigos mais próximos, e depois, para o público geral. A Arábia era politeísta na época e, portanto, a pregação de Maomé de um único deus o colocou em conflito com os habitantes de Meca, cuja economia dependia do politeísmo (os mercadores vendiam estatuetas, figuras e amuletos dos vários deuses) e da estratificação social nele baseada. Os habitantes de Meca tomaram sérias medidas para impedi-lo, mas ele continuou a pregar a nova fé, já que entendia que devia a Deus que o fizesse. No ano de 619, ele perdeu seu tio Abu Talib e sua esposa Cadija (uma data conhecida pelos muçulmanos como O Ano da Dor), e passou a sentir-se solitário e profundamente angustiado, o que se agravou pela perseguição que sofreu em Meca.

Entrada da Caverna de Hira

Em seu socorro, em 621, alguns cidadãos de Yathrib (mais tarde conhecida como Medina), que aceitaram o Islã, convidaram o Profeta e seus seguidores para irem à sua cidade. Em 622 Maomé fugiu de Meca para escapar das conspirações contra sua vida (uma fuga conhecida como Hégira, que marca o início do calendário muçulmano), e foi para Yathrib. Na cidade, admirava-se seus ensinamentos e quiseram que o profeta atuasse como seu governante. Maomé encorajou seus seguidores em Meca a migrarem para Yathrib, e eles o fizeram em bandos. Apenas depois que a maioria de seus companheiros já havia partido, ele migrou com um amigo de confiança (e futuro sogro), chamado Abu Bakr (573-634) [em português, Abacar].

Batalha de BADR

A partir de sua terra nova, os muçulmanos agora queriam contra-atacar aqueles que os haviam perseguido. Eles começaram a conduzir ataques regulares, ou “Razzias”, a caravanas de comércio de Meca. Tecnicamente, estes ataques constituíam atos de guerra; a economia de Meca foi abalada, e eles decidiram acabar com os muçulmanos definitivamente. Os muçulmanos enfrentaram um ataque dos habitantes de Meca na Batalha de Badr (624), na qual 313 deles derrotaram um exército de cerca de 1.000 homens de Meca; alguns atribuem essa vitória à intervenção divina, e outros ao gênio militar de Maomé.

Após a vitória em Badr, os muçulmanos, mais do que apenas um grupo de seguidores de uma nova religião, tornaram-se uma força militar considerável. Vários enfrentamentos se seguiram entre os muçulmanos e outras tribos árabes, com grande êxito dos muçulmanos. No ano de 630, as portas de Meca, a cidade da qual eles haviam fugido em pânico uma década antes, foram abertas ao exército muçulmano. Meca estava agora nas mãos dos muçulmanos e, contra todas as expectativas, Maomé ofereceu anistia a todos aqueles que se rendessem e aceitassem sua fé.

Vista de Meca e da Mesquita Sagrada, em 1900

Quando morreu, em 632, Maomé era o líder político e religioso mais poderoso da Arábia. A maioria das tribos já havia se convertido ao Islamismo e a ele jurado lealdade. Ele morreu em sua própria casa, em Medina, e lá mesmo foi sepultado. O local depois foi convertido em uma tumba chamada de “Roza-e-Rasool” (Tumba do Profeta), que fica ao lado da famosa “Masjid al-Nabwi” (Mesquita do Profeta) em Medina, e é visitada por milhões de muçulmanos todos os anos. O acadêmico J.J. Saunders comenta sobre o Profeta do Islamismo em sua obra Uma história do Islã medieval:

Sua devoção era sincera e natural, e sua crença honesta na verdade de seu chamado só pode ser negada por aquele que estiver preparado para afirmar que um impostor suportou conscientemente por dez ou doze anos a ridicularização, o abuso e a privação, ganhou a confiança e o afeto de homens dignos e inteligentes, e desde então tem sido reverenciado por milhões como o principal instrumento da revelação de Deus ao homem. (34)

As revelações que afirma-se terem sido dadas a Maomé pelo anjo Gabriel foram memorizadas por seus seguidores e, poucos anos após sua morte, foram escritas como o Alcorão (“o ensinamento” ou “a declamação”), o sagrado livro do Islã.

Alcorão, Suna e Hádice

SUNA – Livro Sagrado

De acordo com os muçulmanos, os versos do Alcorão, ditados pelo anjo a Maomé, são as palavras de Deus e a revelação final da verdade divina à humanidade. Após a morte de Maomé, essas revelações foram compiladas na forma de um livro por seu sogro Abacar (que reinou entre 632 e 634 como o primeiro califa – o sucessor da missão e império do Profeta), a fim de preservá-las para gerações futuras. Durante a vida do Profeta, estas revelações haviam sido escritas individualmente em pergaminhos ou outros materiais, e depois foram organizadas na sequência ditada pelo Profeta para formar o Alcorão. Os muçulmanos memorizavam os versos e os declamavam (por isso, uma das traduções do Alcorão é “a declamação”). Mais tarde, notando-se que diferentes muçulmanos estavam recitando os versos em diferentes dialetos, um projeto de padronização foi realizado para preservar as palavras da mensagem do Profeta.

OS ADEPTOS AINDA SÃO ENCORAJADOS A APRENDER O ALCORÃO NO ORIGINAL.

Foi tomado um extremo cuidado para evitar qualquer adulteração do texto. Esta tarefa foi iniciada ainda com relutância pelo sucessor imediato do império de Maomé – o califa Abacar (que tinha receio de realizar algo que o Profeta não havia feito) e foi finalizada no reinado do terceiro califa – Uthman ibn Affan ([em português, Otomão], que reinou entre 644 e 656). Para os muçulmanos, o Alcorão só pode ser compreendido corretamente quando lido – ou ouvido – na língua original. Embora traduções precisas sejam consideradas aceitáveis ​​por certas seitas, os adeptos ainda são encorajados a aprender o Alcorão no original.

Depois do Alcorão, uma importante fonte de orientação para os muçulmanos é a vida do Profeta: seus caminhos (Suna) e seus ditos (Hádice); ambos atuam como um suplemento ao texto do Alcorão. O Alcorão é considerado a Palavra de Deus, como observado anteriormente, mas os muçulmanos também encontram segurança e orientação ao aprender como Maomé teria se comportado em certas situações e, para isso, a Suna e o Hádice são importantes.

Caligrafia de Abacar

Por exemplo, o Alcorão enfatiza repetidamente: “estabelecer a oração e pagar as esmolas”, mas pode-se perguntar, como? A resposta está na Suna e no Hádice, que deixam claro que se deve simplesmente fazer da maneira que o Profeta fez e agir como o Profeta instruiu. Na verdade, em muitos casos, o Alcorão declara: “Obedeça a Alá (Deus) e obedeça ao seu Profeta” (o que enfatiza a importância da Suna e do Hádice). O Hádice, assim como os versos do Alcorão, foi compilado, mas foi mantido separado do Alcorão, de novo para evitar qualquer tipo de adulteração das revelações divinas. A acadêmica Tamara Sonn explica a importância desses elementos em seu livro Islã – Uma breve história:

Sendo a palavra de Deus, ela (o Alcorão) é co-eterna com Deus… O público geral da escritura é a humanidade como um todo… Os muçulmanos acreditam que o Alcorão reitera, confirma e completa essas escrituras anteriores (Torá, Salmos e Evangelho), conclamando todas as pessoas a lembrar e respeitar as verdades nelas carregadas… Juntos, o Alcorão e o exemplo (chamado de Suna) dado pelo Profeta Maomé constituem a orientação de que os muçulmanos precisam em sua responsabilidade coletiva de estabelecer a justiça. (linhas citadas na página 2 e seguintes)

O Alcorão, portanto, fornece aos seguidores a Palavra de Deus, enquanto a Suna e o Hádice dão orientação sobre como alguém observa essa palavra e inclui seus preceitos na vida cotidiana.

Os pilares do Islamismo

Os atos de adoração no Islamismo, ou os “pilares” sobre os quais repousa sua fundação, são os deveres formais que todas as pessoas que o escolhem como seu caminho devem reconhecer e cumprir. Os Cinco Pilares do Islamismo são:

  • Shahada (testemunho)
  • Salat (oração cinco vezes ao dia)
  • Zakat (esmolas/tributos pagos para ajudar os outros)
  • Saum (jejum durante o Ramadã)
  • Haje (peregrinação a Meca pelo menos uma vez na vida)

O primeiro pilar – Shahada – é essencial para qualquer um se tornar muçulmano; é o reconhecimento da unidade de Alá (Deus) em todos os atributos, e é comumente expresso na frase: “Não há ninguém digno de adoração, exceto Alá (Deus), e Maomé é o Profeta de Alá”.

O conceito de Deus no Islamismo afirma que ele está além de todas as imaginações (o pronome “ele” é meramente uma conveniência para o nosso uso, e de forma alguma indica qualquer um de seus atributos) e é o ser mais supremo; seu é tudo o que há no universo, e tudo se submete à sua vontade; portanto, os seres humanos devem viver em paz. De fato, a palavra “Islã” significa literalmente “submissão”, isto é, submissão à vontade de Deus.

Nome de Alá em Caligrafia Árabe

O segundo pilar são as orações diárias – Salah – que devem ser oferecidas cinco vezes ao dia. Os homens são obrigados a oferecer essas orações em congregação em locais de culto islâmico especiais chamados Masjid (as mesquitas), enquanto as mulheres podem orar em casa. O projeto básico das mesquitas varia em cada lugar e, na maioria dos casos, muitos elementos da arquitetura local são nelas introduzidos (por exemplo, a Mesquita Azul de Istambul baseia-se em muitas características arquitetônicas da famosa catedral Hagia Sophia). As áreas de uma mesquita são divididas entre os fiéis masculinos e femininos, e entre os imãs que dirigem o culto de adoração.

O terceiro pilar – Zakat – é a doação de esmolas que devem ser pagas por todas as pessoas elegíveis (indivíduos que possuem uma certa quantidade de riqueza que não está atualmente em seu uso) uma vez por ano para companheiros muçulmanos desprivilegiados (embora outros atos de caridade sejam também aplicáveis para não-muçulmanos, o zakat é reservado apenas para os fiéis islâmicos). Os não-muçulmanos (conhecidos como dhimmi – pessoas protegidas) foram por muito tempo obrigados a contribuir com o imposto conhecido como jizya, mas essa política já foi abolida em muitos países muçulmanos desde o início do século XX.

Mesquita do Profeta em Medina, na Era Otomana

O quarto pilar – Saum – é o jejum durante o mês islâmico do Ramadã (o nono mês do calendário islâmico). Durante o período de jejum, o fiel deve se abster de comer, beber e de todos os prazeres mundanos, e devotar tempo e atenção a Deus. O Ramadã encoraja os fiéis a se aproximarem de Deus e a examinarem suas prioridades e valores na vida; privar-se de alimentação e outras distrações é algo voltado para o foco completo na atenção ao divino.

O quinto pilar – Haje – é a peregrinação anual à Ka’aba [Caaba], a Qiblah dos muçulmanos (a direção em que eles oram – em sinal de unidade) em Meca. A Haje só é obrigatória uma vez na vida de uma pessoa, e somente se ela puder pagar e tiver forças para fazer a jornada. Se não for possível ir, deve-se pelo menos expressar o desejo sincero de fazê-lo e, se possível, contribuir para a peregrinação de outra pessoa.

Propagação do Islamismo

Como já observado, Meca foi a cidade que originalmente rejeitou Maomé e sua mensagem, mas que, mais tarde, tornou-se o coração da fé (pois abriga a Caaba), enquanto Medina, a cidade que acolheu o Profeta quando ninguém mais o fez, tornou-se a capital do império. A Arábia se encontrava na encruzilhada do Império Persa Sassânida (224-651) e do Império Bizantino (330-1453). Como essas duas superpotências estavam quase constantemente em guerra, com o tempo, o povo da Arábia sofreu com a perturbação da região ao seu redor e, uma vez unida sob a fé islâmica, lançou uma invasão em grande escala sobre ambos os impérios para viabilizar a expansão do Islamismo. O acadêmico Robin Doak explica em seu livro O império do mundo islâmico:

Os bizantinos competiam pelo controle do Oriente Médio. O Império Sassânida, ou persa, dominava áreas a sudeste de Bizâncio (atual Istambul). Estes dois impérios estavam constantemente em guerra entre si… Para pagar por estas guerras, os dois impérios impuseram pesados ​​impostos sobre os cidadãos sob seu controle. Estes impostos, junto a outras restrições, causaram inquietação nas terras sassânidas e bizantinas, especialmente entre as tribos árabes que viviam nas periferias dos dois impérios. (6)

Os árabes originalmente tinham uma natureza tribal e careciam de unidade. Essas tribos precisavam ser unidas em prol de estabilidade, e o Islamismo tornou-se o meio para tal. Após a morte do Profeta Maomé em 632, a liderança da Ummah (comunidade) muçulmana foi herdada por Abacar, que assumiu o título de califa (sucessor do Profeta). Em seu breve reinado de dois anos (632-634), ele uniu toda a Península Arábica sob a bandeira islâmica (já que a maioria das tribos abandonou a comunidade), e então enviou exércitos para expandir seu domínio sobre ainda outras tribos árabes, que viviam sob domínio bizantino e Sassânida. Estas campanhas foram tão rápidas e bem-sucedidas que, na época do terceiro califa, Otomão, todo o Egito, Síria, Levante e o que antes era a maior parte do Império Persa Sassânida agora estava nas mãos dos muçulmanos, e todas as tentativas de recuperar o território perdido foram derrotadas com a ajuda dos habitantes locais, que em sua maioria aceitaram o domínio muçulmano.

O quarto e último dos “califas corretamente guiados” (como os primeiros quatro são chamados pelos muçulmanos sunitas), foi Ali ibn Abi Talib (reinou entre 656 e 661). Ali passou a maior parte de seu governo em constantes lutas civis e a expansão foi interrompida. Após sua morte, em 661, ele foi sucedido por Moáuia I (reinou entre 661 e 680), que fundou a Dinastia Omíada. Moáuia I declarou seu filho, Yazid I ([ou, Iázide I] reinou entre 680 a 683), seu sucessor, mas isso foi contestado pelo filho de Ali (neto de Maomé) Hussayn ibn Ali ([ou, Haçane ibne Ali] 626-680). O fraco exército de Hussayn foi derrotado na Batalha de Karbala em 680 pelas tropas de Yazid, na qual ele também foi morto; outras revoltas foram igualmente esmagadas uma a uma, e os califas da Dinastia Omíada continuaram a expansão militar.

Expansão dos Primeiros Califados Islâmicos

No final da Dinastia Omíada (em 750) haviam sido adicionadas ao império a Transoxiana, partes do atual Paquistão, todo o norte da África e a Península Ibérica (também conhecida como Al Andaluz – a terra dos vândalos). Durante o governo dos abássidas (750-1258), alguns ganhos territoriais menores foram feitos, mas a tendência de conquistas rápidas anteriores por meio de avanços militares acabou. Essa tendência foi revivida pelo Sultanato Otomano (1299-1922), que mais tarde adotou o título de Califado do Mundo Islâmico.

A Anatólia e o coração do Império Bizantino – Constantinopla – foram conquistados pelos otomanos em 1453, que então fecharam as rotas comerciais conhecidas como Rota da Seda (que eles então passaram a controlar), forçando as nações europeias a buscarem outras fontes para os bens aos quais haviam se acostumado, e assim lançando a chamada Era dos Descobrimentos, que fez as nações europeias zarparem seus navios para ao redor do planeta, assim “descobrindo” o chamado Novo Mundo. De acordo com alguns estudiosos, no entanto, o Novo Mundo já havia sido alcançado pelo explorador muçulmano chinês Zheng He (1371-1435) em 1421 (embora esta afirmação seja contestada). A Era dos Descobrimentos (também conhecida como Era das Explorações) abriu o mundo, para o bem e para o mal, levando povos de diversas culturas a terem contato uns com os outros em uma escala muito maior do que antes.

As conquistas militares dos otomanos também levaram à expansão do Império Islâmico, mas nesta altura a fé espalhou-se tanto pela conquista como pelo comércio, como é apontado por Ruthven e Nanji, no Atlas histórico do Islã:

O Islamismo expandiu-se por meio da conquista e da conversão. Embora por vezes seja dito que a fé islâmica foi espalhada pela espada, ambas não se confundem. O Koran (grafia arcaica para o Alcorão) afirma inequivocamente, [na Sura 2:256], “Não há coerção na religião”. (30)

Embora o Alcorão tenha vários versos contrários à conversão forçada, é inegável que o islamismo se espalhou inicialmente por meio das conquistas militares. A maioria das populações locais das terras recém-conquistadas aderia a suas crenças anteriores; algumas se converteram por livre decisão, mas também houve vários casos de conversões forçadas (o que, ironicamente, é considerado uma prática não-islâmica). No tempo dos otomanos, no entanto, foi sobretudo o comércio que levou a fé para além das fronteiras, pois muitos pregadores se misturavam às populações locais e estrangeiras, espalhando a fé por meio das excursões.

O Cisma Islâmico: Sunitas e Xiitas

Apesar disso, desde muito cedo o Islamismo não foi uma fé completamente unificada em toda sua extensão. Após a morte do Profeta Maomé em 632, seus seguidores se debateram sobre quem deveria sucedê-lo. Foi decidido, logo após a morte de Maomé, que Abacar deveria se tornar seu sucessor – seu califa. Outro grupo, porém, pressionou para que Ali, primo e genro do Profeta, o sucedesse. A vez de Ali de fato viria, como o quarto califa, mas seus seguidores – Shia’t Ali (adeptos de Ali) afirmaram que ele era o sucessor legítimo de Maomé e, mais tarde, afirmariam que seus três califas predecessores eram, na verdade, usurpadores; estes seguidores de Ali são os muçulmanos xiitas.

A maioria dos muçulmanos, no entanto, afirmava que Abacar, Umar ibn al-Khattab ([em português, Omar] que reinou entre 634 e 644) e Otomão eram sucessores legítimos de Maomé, como Ali, e os consideram legítimos; esses muçulmanos são conhecidos como sunitas (seguidores da Suna, ou, do caminho de Maomé). Inicialmente, ambos eram grupos meramente políticos, mas depois se transformaram em diferenças religiosas.

Batalha de Karbala

As crenças básicas destas seitas são quase idênticas, com a exceção central sendo o conceito dos imãs. Os sunitas consideram os imãs os guias, ou, professores, que orientam os muçulmanos ao longo do caminho do Islamismo (e é a pessoa que lidera a congregação durante as orações), sendo o mais famoso deles o Imã Abu Hanifa – fundador da escola Hanafi de pensamento islâmico sunita. Por outro lado, os xiitas consideram os imãs como um elo de ligação entre Deus e os humanos (um semidivino), e consideram dignos deste título apenas os descendentes de Maomé por parte de Ali e Fátima (filha do Profeta), e posteriormente apenas os descendentes de Ali (com outras esposas), como o Imã Hussayn [ou, Huceine], filho de Ali, que foi morto pelo exército Omíada na Batalha de Karbala em 680.

A perda de Huceine é lamentada pelos muçulmanos xiitas anualmente no festival de Ashura, que é criticado por muçulmanos sunitas que rejeitam as reivindicações xiitas sobre o papel do imã e, embora respeitem Huceine e considerem trágica sua morte, eles não o consideram como semidivino, como fazem os xiitas.

À parte esta divisão, e algumas outras diferenças teológicas, as duas seitas são quase iguais; mesmo assim, seus adeptos têm sido rivais por quase todo o tempo que existiram, como exemplificado pela rivalidade entre a Dinastia Abássida Sunita (Os Abássidas foram uma dinastia árabe que governou a maior parte do Império Islâmico (exceto algumas partes orientais) depois de assumir o califado em 750. Posteriormente, seu império se fragmentou, mas, como califas, eles retiveram supremacia espiritual até 1258. Eles assumiram o título de califa depois de expulsarem a Dinastia Omíada, que governava até então. Assim, eles foram a segunda dinastia que serviu como Califado (632-1924, intermitentemente) e os Fatímidas Xiitas, e entre os Otomanos Sunitas e os Safávidas Xiitas, etc.

O Legado do Islamismo

Apesar do recurso precoce à conquista para espalhar a fé, e da violência sectária que persistiu entre sunitas e xiitas, o Islamismo contribuiu muito para a cultura mundial desde seu nascimento. O renascimento europeu nunca teria acontecido se as obras dos eruditos clássicos romanos e gregos não tivessem sido preservadas pelos muçulmanos. Para citar apenas um exemplo, as obras de Aristóteles – tão fundamentais para desenvolvimentos posteriores em tantas disciplinas – teriam se perdido se não tivessem sido preservadas e copiadas por escribas muçulmanos. As obras do polímata muçulmano Avicena (c. 980-1037) e do erudito Averróis (1126-1198) não apenas preservaram a obra de Aristóteles, mas a sofisticaram por meio de seus comentários brilhantes e, portanto, eles espalharam o pensamento aristotélico por meio de suas próprias obras. Avicena escreveu o primeiro livro coletivo sobre medicina – o Al- Qanun fi-al-Tib (Cânone de Medicina), que era muito mais preciso do que os textos europeus sobre o assunto na época.

Al-Khwarizmi (c. 780-850), o brilhante astrônomo, geógrafo e matemático, desenvolveu a álgebra, e Al-Khazini (século XI) desafiou e encorajou modificações no modelo ptolomaico do universo. O café, provavelmente a bebida mais popular do mundo hoje, foi desenvolvido por monges sufistas muçulmanos no Iêmen no século XV, e foi apresentado ao mundo por meio do porto de Mocha, no Iêmen (associando assim a palavra “mocha” ao café). Estudiosos, poetas, escritores e artesãos islâmicos contribuíram para o desenvolvimento de praticamente todas as áreas da cultura mundial e continuam a fazê-lo nos dias de hoje. É lamentável que atualmente, no mundo ocidental, o Islamismo seja frequentemente associado à violência e ao terrorismo, porque em sua essência o Islã é uma religião de paz e compreensão. Os muçulmanos ao redor do mundo, constituindo um terço da população mundial, seguem – ou pelo menos tentam seguir – o caminho da paz que Maomé os revelou há 14 séculos, e seu legado de compaixão e dedicação ao divino e ao bem maior continua até hoje na forma de seus seguidores.

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Egiptologia

Livro Egípcio dos Mortos

O Livro Egípcio dos Mortos é uma coleção de feitiços que possibilitam auxiliar a alma do falecido na jornada da vida após a morte. O célebre título foi dado à obra por estudiosos ocidentais; o título original é traduzido como O Livro do Surgimento do Dia ou O Livro Para Sair no Dia. Uma tradução mais apropriada seria O Livro Egípcio da Vida, pois o propósito da obra é garantir não apenas a sobrevivência após a morte corporal, mas a promessa de uma vida eterna em um reino muito semelhante ao mundo que a alma abandonou. Os feitiços forneciam essa garantia por meio de detalhes precisos sobre o que esperar durante a travessia do submundo e o tipo de conhecimento necessário para alcançar o paraíso.

Embora a obra seja frequentemente referida como “a Bíblia do Egito antigo”, não é tal coisa, embora ambas as obras compartilhem a semelhança de serem compilações antigas de textos escritos em épocas diferentes, eventualmente reunidos em forma de livro. O Livro dos Mortos nunca foi codificado, e não há duas cópias da obra exatamente iguais. Elas foram criadas especificamente para cada indivíduo que pudesse comprar um exemplar, como uma espécie de manual de auxílio no Outro Mundo. A egiptóloga Geraldine Pinch explica:

O Livro Egípcio dos Mortos é um termo cunhado no século XIX d.C. para um conjunto de textos conhecidos pelos antigos egípcios como os O Livro Para Sair no Dia. Após a tradução inicial do Livro dos Mortos pelos egiptólogos, ele conquistou um lugar no imaginário popular como a Bíblia dos Antigos Egípcios. No entanto, tal comparação é muito inadequada. O Livro dos Mortos não era o livro sagrado central da religião egípcia. Era apenas um entre uma série de manuais elaborados para auxiliar os espíritos dos mortos da elite a alcançar e manter uma vida plena na eternidade (26).

A vida após a morte era considerada uma continuação da existência na Terra, e, após passar por várias dificuldades e julgamentos no Salão da Verdade, um paraíso que era um reflexo perfeito da vida na Terra se manifestava. Após a alma ter sido justificada no Salão da Verdade, ela cruzaria o Lago dos Lírios para repousar no Campo de Juncos, onde encontraria tudo o que perdera na vida terrena e assim desfrutar eternamente. Para alcançar esse paraíso, no entanto, era necessário saber para onde ir, como dirigir-se a certos deuses, o que dizer em determinados momentos e como se comportar na terra dos mortos; por isso, um manual para o além-mundo era extremamente útil.

A História

POSSUIR UM LIVRO DOS MORTOS EM SEU TÚMULO SERIA O EQUIVALENTE A UM ESTUDANTE DOS DIAS MODERNOS TER ACESSO A TODAS AS RESPOSTAS DAS PROVAS AO LONGO DE SUA ESCOLARIDADE.

O Livro dos Mortos originou-se de conceitos retratados em pinturas e inscrições em tumbas já na Terceira Dinastia do Egito (c. 2670 – 2613 a.C.). Na 12ª Dinastia (1991 – 1802 a.C.), esses feitiços, acompanhados de ilustrações, foram escritos em papiro e colocados em tumbas e sepulturas com os mortos.

Seu propósito, como explica a historiadora Margaret Bunson, “era instruir os falecidos sobre como superar os perigos do pós-vida permitindo-lhes assumir a forma de diversas criaturas míticas e dar-lhes as palavras-chave necessárias para admissão em certos estágios do submundo” (47).

Além disso, esses textos serviam para proporcionar ao espírito um conhecimento prévio do que seria esperado em cada estágio da jornada. Ter um Livro dos Mortos em seu túmulo seria o equivalente a um estudante dos dias modernos ter acesso a todas as respostas de todas as provas ao longo de sua escolaridade.

Em algum momento antes de 1600 a.C., os diferentes encantos foram divididos em capítulos e, na época do Novo Império (c. 1570 – c. 1069 a.C.), o livro tornou-se extremamente popular. Escribas especialistas em encantamentos eram consultados para criar manuscritos personalizados para um indivíduo ou uma família. Bunson observa: “Esses feitiços e palavras mágicas não faziam parte de um ritual, mas foram criados para o falecido a fim de serem recitados no pós-morte” (47). Se alguém estivesse doente e temesse morrer, deveria ir a um escriba e pediria que escrevesse um livro ritualístico para o além. O escriba precisaria saber que tipo de vida a pessoa teve para supor o tipo de jornada que deveria se esperar após a morte; então, os encantos apropriados seriam registrados especificamente para aquele indivíduo.

Antes do Império Novo, o Livro dos Mortos era disponível tão somente para a realeza e a elite. A popularidade do Mito de Osíris nesse período fez as pessoas acreditarem que os encantos eram indispensáveis, pois Osíris ocupava um lugar de destaque no julgamento da alma na vida após a morte. À medida que mais e mais pessoas desejavam o seu próprio Livro dos Mortos, os escribas o redigiam, e assim tornou-se apenas mais uma mercadoria produzida para o comércio.

Da mesma forma que as editoras hoje em dia oferecem livros impressos sob demanda ou de obras auto publicadas, os escribas ofereciam diferentes “pacotes” para os clientes escolherem. Eles poderiam exigir quantos encantamentos pudessem pagar. Bunson escreve: “O indivíduo poderia decidir o número de capítulos a serem inclusos, os tipos de ilustrações e a qualidade do papiro usado. O comprador era limitado apenas por seus recursos financeiros” (48).

Do Império Novo até a Dinastia Ptolomaica (323 – 30 a.C.), o Livro dos Mortos foi produzido dessa forma. Continuou a variar em formato e tamanho até c. 650 a.C., quando foi padronizado em 190 feitiços fixos; mas, ainda assim, as pessoas podiam adicionar ou subtrair o que quisessem do texto. Por exemplo, um Livro dos Mortos da Dinastia Ptolomaica que pertencia a uma mulher chamada Tentruty tinha anexado o texto das Lamentações de Ísis e Néftis, o qual nunca fora implementado como parte do Livro dos Mortos. Outras cópias continuaram a ser produzidas com mais ou menos encantos a depender do valor. O único que toda cópia aparenta ter tido, entretanto, foi o Feitiço 125.

Feitiço 125

O Feitiço 125 é o mais conhecido de todos os textos do Livro dos Mortos. Pessoas que não estiverem familiarizadas com o livro, mas que tenham noção geral da mitologia egípcia, podem reconhecer sem nem o perceber. O Feitiço 125 descreve o julgamento do coração do falecido pelo deus Osíris no Salão da Verdade, uma das imagens mais conhecidas do Egito antigo, mesmo que o deus com suas escalas nunca seja efetivamente descrito no texto. Como era vital que o espírito passasse no teste da pesagem do coração para ganhar o paraíso, saber o que dizer e como agir diante de Osíris, Thoth, Anúbis e os Quarenta e Dois Juízes era considerado a informação mais importante que o morto poderia ter consigo.

Quando uma pessoa sucumbia, era conduzida por Anúbis ao Salão da Verdade (também conhecido como o Salão das Duas Verdades), onde faria a Confissão Negativa (também conhecida como Declaração de Inocência). Essa era uma lista de 42 pecados que a pessoa podia afirmar honestamente que nunca havia cometido. Uma vez feita a Confissão Negativa, Osíris, Thoth, Anúbis e os Quarenta e Dois Juízes conferiam, e se a confissão fosse aceita, o coração do falecido era então pesado na balança contra a pena branca de Ma’at, a pena da verdade. Se o coração fosse mais leve que a pena, o espírito seguiria em direção ao paraíso; se o coração fosse mais pesado, era lançado no chão e devorado pela deusa monstro Ammut, e assim a alma deixaria de existir.

O Feitiço 125 começa com uma introdução ao leitor (o espírito): “O que deve ser dito ao chegar a este Salão da Justiça, purgando _____ [nome da pessoa] de todo o mal que cometeu e contemplando os rostos dos deuses.” O feitiço então começa de maneira muito clara, dizendo exatamente ao falecido o que dizer ao encontrar-se com Osíris:

Salve a você, grande deus, Senhor da Justiça! Eu vim até ti, meu senhor, para que possas conduzir-me a fim de que eu possa contemplar tua beleza, pois eu te conheço e sei o teu nome, e sei os nomes dos quarenta e dois deuses que estão contigo neste Salão da Justiça, dos quais vivem daqueles que se alimentam do mal e que sorvem o sangue deles no dia do acerto de contas na presença de Wennefer [outro nome para Osíris]. Eis o duplo filho das Cantoras; Senhor da Verdade é o teu nome. Eis que vim até ti, trouxe-lhe a verdade, afastei de ti a falsidade. Não pratiquei a falsidade contra os homens, não empobreci meus associados, não cometi nenhum erro no Lugar da Verdade, não aprendi o que não deve ser aprendido…

Após esse prólogo, é recitada a Confissão Negativa e o morto é questionado pelos deuses e pelos Quarenta e Dois Juízes. Nesse ponto, informações muito específicas eram necessárias para ser justificado pelos deuses. Era preciso conhecer os nomes das diferentes deidades e suas responsabilidades, mas também era necessário saber detalhes como os nomes das portas e o chão que se precisava atravessar; era necessário até mesmo conhecer os nomes dos próprios pés. Conforme a alma respondesse a cada divindade e objeto com a resposta correta, ouviria a réplica “Você nos conhece; passe por nós” e prosseguiria. Em determinado momento, deveria responder ao chão sobre os pés da alma:

“Não permitirei que pises em mim”, diz o chão do Salão da Justiça.

“Por quê? Eu sou puro.”

“Porque não conheço os nomes dos teus pés com os quais pisas em mim. Diga-me.”

“Imagem secreta de Ha’ é o nome do meu pé direito; ‘Flor de Hathor’ é o nome do meu pé esquerdo.”

“Você nos conhece; entre por nós.”

O ritual se encerra como que o morto deve se trajar quando enfrentar o julgamento e como deve recitar o feitiço:

O procedimento correto neste Salão da Justiça: deve-se proferir este feitiço purificado e asseado, vestido com roupas brancas e sandálias, pintado com delineador preto e ungido com mirra. Deve-lhe ser oferecido carne e aves, incenso, pão, cerveja e ervas quando houver colocado esse procedimento por escrito em um piso limpo de ocre sobreposto com terra sobre o qual nenhum porco ou pequeno gado tenha pisado.

Após isso, o escriba responsável pelo encanto é gratificado por um trabalho primoroso e assegura ao leitor que ele, o escriba, prosperará tal como seus filhos por sua participação na divulgação do feitiço. Ele se sairá bem, diz ele, quando chegar o seu próprio julgamento e será “conduzido com os reis do Alto Egito e os reis do Baixo Egito, e estará na comitiva de Osíris. Um fato um milhão de vezes verdadeiro.” Por fornecer esse conhecimento, o escriba era considerado como parte da estrutura de toda a essência da vida após a morte, garantindo-lhe dessa maneira uma recepção promissora no submundo e a travessia para o paraíso.

Para alguém comum e até mesmo o rei, toda a experiência era muito mais incerta. Se alguém respondesse corretamente a todas as perguntas e tivesse um coração mais leve que a pena da verdade, e se conseguisse ser amável com o rabugento Barqueiro Divino que remava as almas através do Lago dos Lírios, encontrar-se-ia no paraíso. O Campo de Juncos (às vezes chamado de Campo das Ofertas) era exatamente o que se tinha abandonado durante a vida terrena. Uma vez no Campo de Juncos, a alma se reunia com entes queridos perdidos e até mesmo com animais de estimação amados. Ela viveria em uma imagem da casa que sempre conheceu, com o mesmo quintal, as mesmas árvores, os mesmos pássaros cantando à noite ou de manhã, e isso seria desfrutado pela eternidade na presença dos deuses.

Outros Feitiços e Concepções Equivocadas

Havia várias situações em que o falecido poderia cometer erros entre a chegada ao Salão da Verdade e a travessia de barco para o paraíso. O Livro dos Mortos inclui encantamentos para qualquer tipo de circunstância, mas não parece que alguém estava garantido a sobreviver a essas reviravoltas. O Egito tem uma longa história e, como em qualquer cultura, as crenças mudaram ao longo do tempo.

Nem todos os detalhes descritos neste artigo abarcam a totalidade de perspectivas de cada era da história egípcia. Em alguns períodos, as modificações foram pequenas, enquanto em outros a vida após a morte era vista como uma jornada perigosa em direção a um além-mundo apenas temporário. Ainda em outras eras, ou o caminho para o paraíso era considerado muito direto depois que a alma fosse justificada por Osíris, ou também crocodilos poderiam abocanhá-la; curvas e desvios durante o caminho poderiam ser traiçoeiros e demônios apareciam para ludibriar ou até mesmo para atacar.

Nesses casos, a alma precisava de encantamentos para sobreviver e alcançar o paraíso. Eles estão inclusos no livro em títulos como: “Para Repelir Um Crocodilo”, “Para Espantar Uma Cobra”, “Para Não Ser Comido Por Uma Cobra no Reino dos Mortos”, “Para Não Morrer Novamente no Reino dos Mortos”, “Para Ser Transformado Em Um Falcão Divino”, “Para Ser Transformado Em Um Lótus”, “Para Ser Transformado Em Uma Fênix”, e assim por diante.

Os feitiços de transformação tornaram-se renomados por meio de alusões populares em produções televisivas e cinematográficas, o que resultou no entendimento equivocado de que O Livro dos Mortos é algum tipo de obra mágica a lá Harry Potter que os antigos egípcios usavam para rituais místicos. Como observado, porém, O Livro dos Mortos nunca foi usado para transmutações mágicas na Terra; os feitiços só funcionavam no pós-vida. Portanto, a afirmação de que O Livro dos Mortos seria algum tipo de texto de feiticeiro é tão errônea e infundada quanto a comparação com a Bíblia.

O Livro Egípcio dos Mortos também não tem a ver com O Livro Tibetano dos Mortos, embora essas duas obras sejam frequentemente comparadas uma à outra. O Livro Tibetano dos Mortos (nome real, Bardo Thodöl, “A Grande Libertação Pela Auscultação Durante os Estados Intermediários”) é uma compilação de textos a ser lida para uma pessoa que está morrendo ou que morreu recentemente e que informa à alma sobre o que está acontecendo passo a passo. A semelhança que compartilha com a obra egípcia é que tem a intenção de trazer conforto à alma e guiá-la para fora do corpo em direção ao pós-vida.

O Livro Tibetano dos Mortos, é claro, lida com uma cosmologia e sistema de crenças totalmente diferentes, mas a diferença mais significativa é que é projetado para ser lido dos vivos aos mortos; não é um manual para os mortos recitarem por si mesmos. Ambas as obras sofreram com os rótulos “Livro dos Mortos”, o que atrai a atenção daqueles que acreditam que são chaves para um conhecimento esclarecido ou como obras diabólicas a serem evitadas; na verdade, elas não são nada disso. Ambos as obras são construções culturais destinadas a tornar a morte uma experiência mais gerenciável.

Os feitiços ao curso do Livro dos Mortos – não importa em que época os textos tivessem sido escritos ou coletados – prometiam uma continuação da existência após a morte. Assim como na vida, havia provações e curvas inesperadas no caminho; áreas e experiências a serem evitadas; amigos e aliados a serem cultivados, mas eventualmente a alma poderia esperar ser recompensada por viver uma vida boa e virtuosa.

Para aqueles que ficaram para trás na História, as sentenças mágicas foram interpretadas da mesma forma como as pessoas nos dias de hoje leem horóscopos. Horóscopos não são escritos para enfatizar os pontos negativos de uma pessoa, nem são lidos para se sentir mal consigo mesmo; da mesma forma, os feitiços foram designados para que alguém ainda vivo pudesse lê-los, pensar em seu ente querido no outro lado e sentir-se seguro de que eles chegariam em segurança no Campo de Juncos.

Bibliografia

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novembro 1, 2016 · 8:18 am